agora discute-se o alcance de um dos últimos anúncios da casa real de espanha: o duque de palma, suspeito de desviar mais de 6 milhões de euros dos cofres públicos, está excluído das cerimónias oficiais do palácio de zarzuela.
a decisão, divulgada na segunda-feira, surge para muitos como a confirmação de uma ruptura inconciliável entre a gestão do rei juan carlos e as ambições empresariais do genro, já concretizadas numa fortuna estimada em 11 milhões de euros.
«a casa real não gosta que os seus membros se metam em negócios. trabalho sim, negócios não», avisava há mais de um ano jaime peñafiel, jornalista da telecinco especializado em assuntos monárquicos.
«agora percebem a razão desta política? a promiscuidade da família real com os investimentos privados é meio caminho andado para descredibilizar a monarquia», comenta-se entre incontáveis páginas de opinião, publicadas na imprensa espanhola num tom unânime de condenação.
a ofensiva mediática contra o duque de palma reforçou-se com o anúncio do seu afastamento dos compromissos da casa real, recebido como mais um indício de culpa da sua gestão fraudulenta à frente do instituto nóos – entidade sem fins lucrativos especializada na promoção de eventos desportivos e turísticos.
mas a mesma voz oficial que confirma a saída de cena do marido da infanta cristina – baseada num comportamento que «não parece exemplar» – apressa-se a desaconselhar juízos precipitados.
«produziu-se um julgamento popular próprio de estados e regimes de outros tempos, no qual não se admite a presunção de inocência», lamenta rafael spottorno, chefe da casa real, entre apelos à moderação.
facturas falsas e serviços fictícios
mas será possível provar a inocência do genro do rei, questionam os espanhóis?
além das desconfianças desencadeadas pelo enriquecimento súbito do duque – em 2005 comprou uma mansão avaliada em mais de 7 milhões de euros –, os documentos e os depoimentos recolhidos pelas autoridades colocam o antigo presidente do instituto nóos em maus lençóis.
acusado pelo seu antigo braço-direito e já arguido no processo, diego torres, iñaki é apresentado como o «responsável por todas as decisões» do nóos que estão sob escrutínio fiscal e judicial. em causa, além da facturação de serviços fictícios a empresas geridas pelo próprio duque – como a imobiliária aizoon –, está a apropriação indevida de dinheiros públicos.
«o esquema do instituto nóos consistia primeiro em fixar preços totalmente desproporcionais em relação aos serviços que prestava à administração pública, depois em receber os fundos e simular a contratação de serviços fictícios a empresas», descrevem os investigadores nas mais de 100 páginas de averiguações sobre a entidade.
o dedo acusador contra as actividades do nóos – processo incluído no chamado caso palma arena, que começou a ser investigado em 2007 a propósito da construção de um mega complexo desportivo – não se desvia nem um milímetro de iñaki. não estranha por isso que o nome do genro de juan carlos comece a circular agarrado ao rótulo de arguido.
apesar de reclamar inocência, e de se declarar «indignado» com as acusações que se avolumam contra si em jornais de todo o mundo, o antigo ídolo do andebol espanhol, duas vezes medalha de bronze nos jogos olímpicos, parece condenado ao descrédito.
«com todo esse talento para fazer tanto dinheiro em tão pouco tempo, do que estão à espera os governantes europeus? contratem-no para resgatar a ue da crise», ironiza-se entre cliques de manifestos online por onde se encontram também interrogações dirigidas ao futuro da filha do rei.
isso? «já se verá», contemporiza o chefe da casa real, na resposta a outra das interrogações mais ouvidas nas ruas. entre os que condenam o casamento da infanta ao divórcio, cenário tantas vezes desenhado nas revistas cor-de-rosa, e os que lembram que também a infanta tem participação em alguns dos negócios sob investigação, sobrepõe-se o tal «já se verá» do palácio de zarzuela.
por enquanto, fica a certeza do eclipse real de iñaki – desde 12 de outubro ausente de eventos oficiais – e a promessa da inauguração, até ao final do ano, de uma nova política de transparência na casa real.
«tornaremos públicas as contas e explicaremos as despesas mais importantes», esclarece o porta-voz do rei, desviando por instantes as atenções dos milhões da fraude para os milhões do orçamento de zarzuela.