O chique modesto

Ao ler alguns textos sobre a forma como a sociedade americana está a viver o momento, percebe-se que o mundo dito civilizado irá alterar, quase de forma radical, a sua forma de vida.

ao consumo desenfreado, seguir-se-á a contenção e formas de vida ditas mais saudáveis, como defende naomi wolf. a ostentação será sinónimo de novo-riquismo – deixada para os países emergentes e para os craques do espectáculo, sejam da música ou do futebol. digamos que aqueles que provaram os excessos se irão retirar, à força é certo, e que os novos consumidores irão desfrutar das maravilhas que o dinheiro proporciona. percebe-se. quem está falido e desgostoso irá lançar a moda da contenção chique. as mesmas figuras que alardeavam a sua modernidade nos lugares mais in, serão as mesmas que irão aclamar os prazeres das vidas simples. como se vê, nem tudo é mau na crise.

há já uns anos, quando rebentou o 11 de setembro, em conversa com um amigo que trabalhava no edifício das nações unidas, em nova iorque, e que tinha uma vida bastante citadina, ele revelava-me que o seu sonho e ambição era fugir da cidade que não dorme e refugiar-se algures onde o seu filho pudesse crescer sem o medo de atentados e onde o tempo não lhe fugisse entre os dedos. agora a realidade ultrapassou um pouco os desejos desse meu amigo, um consagrado e respeitado jornalista. lê-se actualmente que os americanos, os tais que usufruíam dos luxos citadinos, que não era o caso do meu amigo, procuram viver longe do rebuliço das cidades e que tentam levar uma vida mais ecológica. ninguém quer saber dos luxos gastronómicos de fusão, como as espumas dos chefes da restauração que conseguiram essa proeza inigualável de fazer com que as pessoas sonhassem que estavam a ingerir iguarias únicas, quando tudo não passava de uma experiência como outra qualquer.

sendo os eua um país exportador de costumes e modas, não será pois de estranhar que as ditas cheguem rapidamente à europa e vejamos os ícones outrora do consumo a passarem-se para o outro lado. o que se pode concluir é que a falta de dinheiro, quando temos o suficiente para viver condignamente, provoca mudanças de comportamento saudáveis. as pessoas são obrigadas a pensar em actividades mais nobres e a não viverem da ostentação e do vazio do luxo pelo luxo. e talvez passem a pensar um pouco mais nos outros e não sejam tão egocêntricas.

embora defenda que os ricos devem consumir para fazerem a economia avançar (se assim não for as falências no comércio e afins irão disparar ainda mais), não há dúvidas de que a sociedade estava a caminhar para um lugar de pura fantasia. para alguns, é claro. tenham um bom natal.

vitor.rainho@sol.pt