o cartaz promocional anuncia «momentos de pura verdade», enquanto os episódios se exibem com créditos de «série documental». mas, avisa o autor, o termo mais correcto para apresentar esta história é mockumentary. «uma paródia ao documentário» que convém não «confundir com moca de documentário». ou, numa definição impessoal: um misto de ficção e realidade.
a diferença faz as honras na casa d’este senhor, espaço de entretenimento que abriu portas na internet sob a forma de vídeos – integrados numa acção de marketing da cerveja tagus – e, através de milhares de visitas online, se expandiu para o pequeno ecrã da sic radical.
as próximas cenas, a estrear após o lançamento das primeiras em dvd, estão já a ser «cozinhadas com especiarias de bali», revela ao sol carlos afonso, por «nervosismo ou desconforto», disponível apenas para entrevistas por escrito. «divago sobre ‘coisas’, o que faz com que o entrevistador tenha mais trabalho a juntar os fragmentos do que lhe interessa», assina a identidade por trás d’este senhor, personagem desenvolvido entre múltiplos rasgos. «considero-me um executante de ideias, minhas ou de outros. às vezes trabalho como actor, noutras não. mas sempre que o faço é com enorme prazer».
matemática para chegar à sic
quando não o faz, carlos desdobra-se nos papéis de apresentador, locutor de publicidade, realizador e também empresário, derradeiro engenho de uma carreira lançada a partir dos cálculos.
«tinha chumbado no 12.º ano porque os números não eram o meu forte. então o meu pai – que trabalhava na sic – sugeriu que tivesse explicações com um professor de matemática exímio que era também o director de planeamento e relações institucionais do canal».
mais do que ajudar a desembaraçar contas, rui silva lopes – ou «dr. silva lopes na apresentação do ex-pupilo» – ajudou a escrever os primeiros capítulos do que o agora este senhor revê como «uma história curiosa». com princípio num estágio televisivo – «passei nos testes de matemática para poder trabalhar na sic» – passagem por uma formação em inglaterra – «tive a oportunidade de tirar um curso de edição e emissão de imagem na sony broadcast school de londres» – e sem um final fechado. «descobri a edição de vídeo e as suas possibilidades criativas», conta o realizador, de momento também entretido com a produção do próximo vídeo da banda orelha negra.
de volta aos primeiros voos, carlos recorda o ultimato que transformou a «alegria de poder continuar na sic numa miragem presa por números», ou meta distanciada pela obrigatoriedade de uma aprovação na prova nacional de matemática.
«o exigente dr. silva lopes disse-me rigorosamente o seguinte: ‘muito bem, agora falta o exame. só cá ficas se passares’. era um ponto de honra para ele».
para carlos foi o ponto final numa relação difícil com as contas: «o que tem de ser tem muita força e eu tinha mesmo de ficar na sic».
primeiro atrás das câmaras como editor de imagem e depois na pele de bondage – repórter popularizado no extinto programa noites marcianas, ainda hoje recordado pela inconveniência das abordagens. «quando escolhi esse nome para o personagem fi-lo com o propósito de amarrar os entrevistados com questões e situações».
o atrevimento valeu-lhe um soco de elsa raposo e ameaças de processos judiciais de algumas figuras da imprensa cor-de-rosa, como lili caneças ou pimpinha jardim. nada de alarmante, porém, a avaliar pelo tom despreocupado que acompanha essas memórias.
esmurrado e processado
começando pelo murro – recebido na resposta a uma comparação entre a troca de namorados de elsa raposo e a rodagem de uma bicicleta de bairro –, carlos recorda, com a autoridade de quem treina boxe há dez anos, que o soco «não passou de um carinho» porque «a elsa é bruta nos carinhos». já o desaguisado com lili caneças encerra-se entre declarações de afecto.
«a lili ama-me e tudo se resolveu», ameniza o actor ocasional. seguem-se os planos para a primogénita de cinha jardim: «é a próxima tatuagem da tuxa» – a transexual também conhecida como o troféu mais valioso do apelidado ‘maior caçador de cromos de portugal’.
antes bondage (2000), agora este senhor – personagem nascido no programa maxmen (2006) –, carlos afonso mantém as inspirações de sempre. «em portugal as minhas referências são um realizador de cinema com quem já trabalhei, o ‘luís da marreca’, e o tio do meu melhor amigo. lá fora gosto deles também, mas raramente viajam, à excepção do luís». dentro ou fora, o fio condutor é sempre o mesmo: o gozo. por isso, no momento de «urgência de criar uma firma para contratar pessoas e viabilizar o projecto na casa d’este senhor», o humor falou mais alto. «tive acesso aos nomes possíveis para registo rápido da empresa e pato vaidoso era uma das hipóteses. imaginei imediatamente um pato orgulhoso a fazer cocó e isso fez-me rir». carlos riu-se, a pato vaidoso produções nasceu.
paula.cardoso@sol.pt