lloyd saiu-se bem com mamma mia, um filme jubilatório, como já não se via desde as grandes comédias musicais de arthur freed, e percebeu que a vida política da famosa ‘dama de ferro’ podia dar um filme de sucesso. meryl streep trataria de lhe garantir, pelo menos, uma honrosa nomeação para os óscares.
acontece que, um e outro, como era quase inevitável, são dois estrondosos falhanços. qualquer documentário aplicado que relate a vida daqueles dois grandes personagens (determinados e maléficos, temidos e odiados) teria mais possibilidades de nos dar a conhecer a personalidade, a carreira e as obsessões quer do histórico chefe do fbi quer da primeira mulher que chefiou o governo de sua majestade. um filme biográfico é sempre uma tarefa impossível, sobretudo se pretende abarcar uma vida, em vez de se fixar num episódio detonador e exemplar. clint eastwood sabia-o, quando escolheu fazer a biografia de mandela apenas a partir da sua saída da prisão e centrando-se numa famosa final do campeonato do mundo de râguebi que se realizou na áfrica do sul em 1995.
para além dos problemas de caracterização que se põem sempre a filmes que abarcam períodos muito longos de uma vida (ao contrário da maquilhagem de meryl streep, que é brilhante, no filme de ce, com excepção de leonardo di caprio, o envelhecimento dos outros actores é desastroso), há dois problemas incontornáveis num biopic: o primeiro é que os filmes são obrigados a presumir que o espectador conhece o personagem e a sua história, sem o que muitos episódios, tratados forçosamente sem tempo para serem devidamente enquadrados, ficam sem sentido. o segundo é que uma vida é cheia de incidentes, um puzzle complexo onde é difícil encontrar a unidade dramática que pode ter, pelo contrário, um episódio singular da vida de um grande personagem.
como acontece com miss thatcher, no final de j. edgar ficamos sem saber o que eastwood pensa do seu personagem. o que levou um liberal, que sempre denunciou o nacionalismo, a intolerância e a moral puritana, o mais engagée dos realizadores americanos pós-preminger, a interessar-se por um polícia todo-poderoso, perseguidor de comunistas e delinquentes, que sobreviveu a oito presidentes e reinou durante décadas pela chantagem e pelo medo e que escondia, afinal, uma homossexualidade mal assumida?
pela ambição impossível de traçar a história complexa de uma vida, um e outro filme perdem-se numa montagem arbitrária de episódios dispersos, avulsos e sem nexo, flashes de um puzzle incompleto a que nem um nem outro conseguem dar um sentido.
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