Em nome da burca

Uma das imagens mais chocantes que chegam ao mundo ocidental, além das de violência física, é a de mulheres vestidas com burca.

elas são seres que não têm direito a ter rosto. por baixo do pano que as cobre dos pés à cabeça, não se sabe o que existe. o que diz o seu olhar, o seu sorriso ou a sua tristeza. para mim, é das coisas mais inqualificáveis no que aos costumes diz respeito. por essa razão, entre muitas outras, não consigo encontrar compreensão com esses povos que submetem as mulheres a uma não existência. é como se elas não tivessem direito à luz do dia. haverá, no entanto, razões culturais que sustentam tais costumes e que não são perceptíveis, seguramente, ao olhar de um ocidental. digamos que ainda estão na idade média e que, no futuro, as coisas se hão-de alterar. exemplo do atraso cultural, ao nosso olhar, é a arábia saudita, um dos bastiões do fundamentalismo, e ao mesmo tempo da modernidade, que não se tem vergado muito aos costumes ocidentais, já que as mulheres nem sequer podem conduzir…

vem esta conversa a propósito de um fait divers que encheu páginas de jornais um pouco por todo o mundo. numa pequena localidade italiana, castello di serravalle, os pais de alguns alunos querem que a professora seja banida porque é «demasiado bela e demasiado sexy», não podendo por isso ensinar os seus filhos. ao que consta, a professora é modelo nos meses de verão e faz umas produções um pouco ousadas, embora nunca se dispa totalmente. o que levará os europeus a terem uma relação com o corpo tão estranha? por que razão as pessoas ainda convivem tão mal com a beleza física? para se ser professora é preciso ser feia e andar com burca? não consta, por exemplo, que no passado as grandes esculturas de mulheres, onde as formas robustas eram sinónimo de beleza, fossem chocantes. o que levará a que agora uma professora mais sensual seja um atentado ao pudor? as crianças não podem sonhar com a bela professora?

há uns tempos, em portugal, passou-se um fenómeno semelhante. ao aparecer semidespida numa revista, uma professora acabou por ser transferida da escola onde leccionava. tornou-se um sucesso no universo das redes sociais e hoje acho que já ninguém se lembra dela. a terra em questão é que não ficou com boa fama. mas o que levará pessoas habituadas diariamente a ver imagens na televisão, onde a sensualidade transborda no ecrã, a revoltarem-se contra a beleza de uma professora? mas a sensualidade fere alguém, que não os costumes ancestrais e bacocos? por este andar, o mundo ocidental caminha mais na direcção dos fundamentalistas do que o contrário. o que não augura nada de bom.

vitor.rainho@sol.pt