como surgiu a teia de gelo?
talvez tenha a ver com uma história que a minha mãe me contou quando eu tinha 15 anos. metia uma casa com umas mulheres que tinham matado um homem. vem do imaginário das tradições de família, da nossa casa em serpa. a história ficou at the back of my mind e um dia comecei a escrever isto, ainda estava a fazer o meu primeiro filme, o contrato.
a crítica não foi simpática com o contrato. dá-lhe importância?
tenho-lhe o maior respeito, não vivo a pensar nela. a minha crítica é o público, e o filme fez mais de 45 mil espectadores.
porque realizou agora um thriller?
gosto de cinema que me faça mexer na cadeira. se calhar é uma catarse da minha inquietação.
tem algum autor favorito dentro do género?
o hitchcock primeiro que tudo. ele faz suspense a partir de coisas que não existem. n’a teia de gelo há uma gargalhada da paula lobo antunes que é a coisa mais terrífica do filme inteiro. e é só uma gargalhada.
a sua imagem sempre esteve mais ligada à comédia.
gosto de desafiar as pessoas. um dia sonhei que se fazia uma novela em portugal e nasceu a vila faia. toda a gente se riu com a ideia: ‘epá isso é uma utopia, fazer novelas em portugal é um disparate!’. foi tanto uma utopia que a meu amor e a laços de sangue ganharam nos últimos anos emmys internacionais para melhores telenovelas.
é verdade que filmou a teia de gelo em português e inglês?
os actores são bilingues, por isso fizemos cada take nas duas línguas. é possível fazer cinema português fora de portugal, essa é a minha outra utopia.
o ruy de carvalho disse uma vez que enquanto director de actores o nicolau sabia pedir.
há directores de actores que não sabem sequer aquilo que querem. eu digo o que quero e depois dou-lhes liberdade para criarem. costumo dizer aos meus alunos de representação: ‘surpreendam-me, mesmo que seja uma grande merda, mas façam qualquer coisa de diferente’.
com que realizadores mais gostou de trabalhar?
antónio-pedro vasconcelos e leonel vieira. são homens de uma grande visão. não são tacanhos. não realizam filmes para os amiguinhozinhos verem aqui no nosso paízinho.
mas eles fazem filmes para o público generalista português.
não se exporta cinema de autor.
para si não significam nada os prémios do joão salaviza e do miguel gomes em berlim?
claro que sim, mas são prémios de festivais de cinema de autor.
com que realizador português gostaria de vir a trabalhar?
com o joão canijo. é um cinema negro, às vezes pouco agradável, mas é muito bom.
pode-se dizer que o canijo é um autor.
é, mas é bom. bem, filmes de autor são todos. foi aquela coisa horrível chamada cahiers du cinéma, a desgraça do cinema europeu, que criou essa figura do cinema de autor.
tenta fazer cinema à americana?
sim. detesto o american way of life, mas em cinema tiro-lhes o chapéu. eles percebem que o cinema não é só uma arte, é uma indústria.
como foi contracenar com o jeremy irons nas rodagens de night train to lisbon?
ele tem uma segurança enorme. nos primeiros dias ele era um pouco stiff, frio, mas depois rimo-nos com uma bacorada qualquer, fomos almoçar e jantar várias vezes juntos, ficámos amigos.
por onde andaram?
muitas vezes ficámos no hotel a conversar, fomos ao solar dos presuntos, houve uma noite em que fomos à casa do luís horta e costa, em cascais.
com 51 anos de carreira, o que sente que lhe falta fazer?
a coisa que mais gosto de fazer é realizar: tenho mais dez histórias escritas, o próximo filme vai ser uma comédia. mais novelas, porque nasceram comigo. menos teatro. mais talk shows. trabalho 13, 14 horas por dia, não dá para mais.