o partenon serviria de matriz à arquitectura, a poética de aristóteles tornou-se o manual de quem quisesse contar uma história com princípio, meio e fim, o sistema político de péricles impor-se-ia como um modelo a ser aperfeiçoado e imitado em todo o mundo (ainda que muito mais tarde). já para não falar nas comédias de aristófanes, na escultura de fídias e na filosofia de platão…
até há bem pouco tempo, falar da grécia era falar da sua cultura e de uma civilização exemplar. entretanto aconteceu o que aconteceu e aquele país entrou numa instabilidade política que ninguém consegue prever onde irá parar. grécia tornou-se sinónimo de crise, de tragédia, de ruína.
temos dificuldade em conciliar os tumultos que as televisões hoje nos mostram com o ideal de beleza clássico – sereno e ordeiro. porém, se virmos com atenção, a arquitectura do partenon é monumental, viril e musculada, própria de um povo guerreiro. a cultura grega só pôde florescer porque os gregos eram aguerridos e se impuseram militarmente aos seus vizinhos.
aqueles que estranham que o mesmo povo que produziu tantas obras-primas do espírito se mostre agora tão conflituoso devem recordar as palavras que primo levi escreveu há 65 anos a propósito dos campos de concentração: «na primeira fila estão os gregos, imóveis e silenciosos como esfinges, acocorados sobre o chão com as suas gamelas de sopa espessa [um bem altamente cobiçado nos campos], fruto do seu trabalho, do seu tráfico e da sua solidariedade nacional». essa ‘riqueza’ resultava, dizia ainda levi, «da prática sistemática e científica do roubo, da luta encarniçada para aceder aos lugares mais importantes e pelo monopólio da bolsa de troca».
talvez os gregos de hoje não sejam tão diferentes dos que construíram o partenon e dos que sobreviveram aos campos de concentração. mas as características que outrora os conduziram à glória – ou lhes asseguraram a sobrevivência –, hoje podem ser decisivas no processo de autodestruição. e, quem sabe, arrastar atrás de si a europa, que há 25 séculos a grécia tanto contribuiu para civilizar.