M.A.D.

Oequilíbrio nuclear do terror entre os Estados Unidos da América e a União Soviética durante a ‘guerra fria’ era conhecido pelo acrónimo MAD – Mutual Assured Destruction (destruição mútua garantida) – num feliz trocadilho com a loucura da situação. Loucura que, todavia, preveniu o holocausto nuclear e garantiu a paz.

este tipo de equilíbrio vem-me à mente quando penso no braço-de-ferro entre a zona euro e a grécia. é muito mais que o bluff num jogo de póquer, onde só uma das mãos pode perder. aqui, ambos os lados têm poderosas armas de destruição e um grande potencial para infligir danos recíprocos.

a saída da grécia do euro – necessariamente desorganizada, no ponto a que chegámos – terá custos muito grandes para os envolvidos. para os gregos, será um cataclismo de proporções imensas. o corte do financiamento externo significa, no imediato, ainda maior austeridade. a inexistência de uma moeda alternativa, pronta a entrar em circulação, conduzirá a uma economia de trocas directas que poderá durar meses, com danos incalculáveis na produção e bem-estar. enfim, será uma barbárie dominada por extremistas e, perante a qual, se vê mal como o exército poderá deixar de intervir.

para a zona como um todo, os impactos directos são conhecidos: grandes perdas associadas à dívida soberana detida pelos bancos centrais (ou seja pelos contribuintes europeus) e à dívida privada detida pelos particulares; e o perigo de contágio a países mais vulneráveis, com portugal à cabeça. mas, mais profundamente, um regresso da grécia ao dracma significaria que o euro não é irrevogável e, portanto, que o seu estatuto como moeda de reserva internacional concorrente do dólar americano ficaria muito comprometido.

como nada garante que, em seguida, a grécia não será forçada a sair da ue – por exemplo, na sequência de um golpe militar –, o próprio projecto europeu poderá ficar comprometido numa zona fulcral para a paz no ocidente.

neste cenário, tal como durante a ‘guerra fria’, impõe-se menos dogmatismo e mais real politik. o bce tem de fazer tudo o que for necessário para manter o euro uno e coeso. entretanto, deve preparar-se a ‘grande barganha’ isto é, a ‘mutualização’ da dívida soberana, em troca da aceitação de uma possível perda de soberania financeira em casos graves de incumprimento e desgoverno.