Patti Smith regressa aos discos com Banga

Para Patti Smith, a música sempre foi um veículo para desenvolver a sua arte primordial: a poesia. Depois de vários anos de deriva artística – antes procurou encontrar-se na pintura, como nos conta em Apenas Miúdos, o livro autobiográfico lançado em Portugal no ano passado pela Quetzal –, a descoberta sonora como forma de ampliar…

quase 40 anos depois da estreia, e oito sem um disco de originais, banga, o 11.º álbum da poetisa-cantora (cujo título é inspirado no cão de margarita e o mestre, romance do russo mikhail bulgákov), devolve-nos essa patti smith musicalmente lírica e concentrada nas explorações poéticas experimentais, intimistas, energéticas e, muitas vezes, abstractas e indecifráveis.

por isso mesmo, não é de estranhar que tenha convocado para parceiros de criação os mesmo cúmplices de horses: o guitarrista lenny kaye, o baterista jay dee daugherty e o baixista e teclista tony shanahan. este ‘reencontro’ com o passado acabou por também influenciar patti smith a criar um disco povoado de referências.

além de evocar, novamente, a memória do fotógrafo e melhor amigo robert mapplethorpe (na canção ‘just kids’, como o romance homónimo), a cantora dedica ‘this is the girl’ a amy winehouse (que nunca chegou a conhecer) e ‘maria’ à actriz francesa maria schneider, ambas falecidas em 2011. há ainda referências à destruição que tomou conta do japão no ano passado, na canção ‘fuji-san’. mas isso não chega para fazer de banga um disco negro.

a excelente versão de ‘after the gold rush’, de neil young, o single bem-disposto de avanço ‘april fool’, o longo devaneio esotérico, de 11 minutos, expresso em ‘constantine’s dream’ ou o sonhador ‘americo’ são alguns exemplos do luminoso trabalho que agora nos chega e que mostra uma patti smith, aos 65 anos de idade, com uma força criativa renovada, num terreno de composição onde ela ainda é a única rainha.

alexandra.ho@sol.pt