Fionna Apple, extraordinária máquina avariada

Passaram-se sete anos desde Extraordinary Machine, o terceiro e muito aclamado álbum de Fiona Apple. A espera foi longa, mas é agora compensada com um disco extraordinário.

o primeiro cartão-de-visita ao novo registo é, logo, o retrato que ilustra a capa: uma imagem imperfeita e caótica, mas também sedutora e enigmática. muito próxima daquilo que se adivinha ser fiona apple.

diagnosticada obsessiva-compulsiva na adolescência – depois de ter sido violada por um desconhecido aos 12 anos de idade, no prédio onde vivia com a mãe em nova iorque –, a música sempre foi uma forma assumida de catarse da cantora. mas dentro do estilo confessional, fiona apple é do melhor que há.

a sua auto-exposição pública assenta sempre em letras cruas, frias e distantes, muitas vezes reflexo das suas tendências auto-destrutivas e personalidade temperamental. mas a sinceridade frontal nunca é caminho aberto para banalidades ou clichés. pelo contrário, fiona apple encara a realidade como exercícios constantes para construir metáforas inteligentes sobre o seu caos interior, cobertas pela sua voz quente e melodiosa.

em entrevista ao new york times, a cantora explica que the idler wheel nasceu, precisamente, depois de mais um período ‘negro’ na sua vida. «estava, outra vez, numa espiral descendente e tudo na vida me parecia mau», revelou ao jornal, acrescentando que é nestas alturas que o distúrbio obsessivo-compulsivo fica mais desperto.

durante anos, incapaz de compor uma canção, começou a subir e descer uma colina perto de sua casa, durante cerca de oito horas por dia, até os seus joelhos não lhe permitirem andar mais. «havia qualquer coisa naquilo que se assemelhava a um rito de passagem», diz.

o lado terapêutico deste esforço físico, só fiona apple saberá exactamente qual foi. mas é certo que surtiu efeito. o novo disco é o mais complexo, incisivo e descarnado da cantora até à data. é um trabalho despojado e cortante, mas dotado de uma elevada confiança, que não se conhecia anteriormente na artista. apesar dos sete anos de espera, fiona apple conseguiu provar que, por muito em baixo que esteja, vai continuar por cá, corajosa, a retribuir a devoção que os seus fãs lhe atribuem desde 1995, quando se estreou nisto de fazer discos.

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alexandra.ho@sol.pt