Salão Neurótico: Trocadilho Dundee

«Gostámos muito de te ter aqui, mas devias ser criativo numa agência de publicidade». O conselho já o ouvira da boca dos colegas do secundário, mas agora vinha da equipa do Imagens de Marca.

«uma coisa é ter os amigos a dizê-lo, outra é ouvi-lo de pessoas que lidam com os melhores cérebros», conta joão silva, 30 anos, sobre o fim da experiência como jornalista estagiário naquele programa televisivo, depois de se licenciar em marketing.

encarando «o assunto com outra seriedade», joão arriscou responder a um anúncio de uma agência publicitária. não pediam currículo nem portefolio, ratoeira perfeita para apanhar a melhor das mentes imaginativas. e joão silva mordeu o isco, «ao enviar um guião de um vídeo de 40 segundos em que era raptado para a secção comercial e pediam um resgate» por ele. foi aceite como _estagiário, evoluiu para copywritter – «redactor das campanhas de publicidade que normalmente trabalha em dupla com um designer», explica o próprio – e ficou na empresa durante três anos.

foi no último ano desse trabalho, que o criativo – hoje noutra empresa de activação de marca _– criou o salão neurótico, uma página na rede social facebook que já começou a servir de lição no meio publicitário. apesar de joão insistir que ali é o seu lado pessoal, e não o profissional, a ditar as regras.

o salão diz-nos que fora de horas joão diverte-se e muito a fazer trocadilhos visuais. como aquele em que uma bóia laranja surge na cintura de um sylvester stallone de fita vermelha na testa. a legenda: ‘rambóia’. ou aquele em que o mais famoso líder pacifista indiano abre a bocarra de um crocodilo, lembrando um filme protagonizado por paul hogan: ‘crocodilo gandhi’.

o primeiro trocadilho do género surgira quando ainda escrevia para um blogue e se lembrou de publicar um poliban a discursar na casa branca: ‘george duche’. escoou outras fusões imagéticas no perfil pessoal do facebook e o efeito bola de neve nos comentários fê-lo questionar-se sobre o seu hobby preferido, nascido no sofá a ver séries como monty python ou tal canal, com herman josé. «será que mais gente gostava de fazer o mesmo?».

era só uma questão de provocar as pessoas, pensou. «a criatividade não é uma formação académica, para que ela surja só é preciso que as pessoas estejam totalmente à vontade com a linguagem usada».

quanto mais parvo, melhor

a partir deste mote, em janeiro do ano passado, criou o endereço facebook.com/salaoneurotico, onde o desafio é partilhar trocadilhos feitos a partir de imagens procuradas no motor de busca google e idealmente trabalhadas com o programa paint (do software microsoft windows). «o importante é a ideia, quanto mais parva melhor. a execução é secundária».

hoje o salão conta com quase 40 mil amigos, mais de 10 mil contribuições (300 são do joão), e entre 100 e 300 pessoas a publicar activamente todos os dias. artistas a quem o criador chama de ‘gente bonita’ e ‘adoráveis seres’ e cujas assinaturas faz questão que acompanhem as respectivas obras no salão.

o projecto já levou joão a discursar em congressos de publicidade e marketing, onde criticou «as marcas que criam perfis no facebook onde os consumidores são apenas angariadores de ‘likes’ sem perceberem que eles devem ser uma parte activa do processo». mas não é só esse o segredo do sucesso do salão, afiança. «a diferença vem quando fazemos aquilo que queremos, gosto do meu trabalho mas nem toda a gente tem essa sorte, e aqui todos podemos ser um bocadinho parvos. todos podemos libertar-nos».

aisha.rahim@sol.pt