oliver sim é conhecido como o mais falador dos três músicos que constituem os the xx. e parece ser bem verdade. como acontece sempre nestas ocasiões, o tempo das entrevistas é cronometrado ao minuto, mas o músico dá a entender que não se preocupa muito com isso. mesmo quando o representante da editora entra na sala do hotel de lisboa onde decorreu a conversa com o sol (em junho, quando a banda londrina veio ao optimus primavera sound, no porto) para avisar que já tínhamos ultrapassado o tempo previsto, oliver não acelera o ritmo da conversa. em vez disso, continua a desenvolver cada resposta que dá de forma calma e pausada. apesar dos seus joviais 23 anos, percebe-se que podíamos estar ali horas a falar com ele sobre música, séries televisivas, arte, sucesso e, inevitavelmente, relações amorosas, a base de todas as composições dos xx.
a faceta comunicadora em público não é, no entanto, inata em oliver. e o músico é o primeiro a reconhecer isso. «olho para a florence [+ the machine], que é uma boa amiga minha, e só penso: ‘ela nasceu para fazer isto!’ ser uma estrela pop é algo que lhe sai naturalmente. comigo não foi nada assim, tive de trabalhar bastante para estar confortável em cima de um palco, perante milhares de pessoas», comenta. talvez por isso mesmo, repete várias vezes que a grande mudança do primeiro disco, xx, para o novo coexist (nas lojas segunda, dia 10) é a confiança extra que alcançou.
esse amadurecimento tornou-se evidente em maio, quando a banda regressou aos palcos. depois de dois anos de hibernação em londres – com muitas semanas passadas consecutivamente sem ver a luz do dia, num apartamento alugado para albergar o estúdio da banda –, os xx agendaram alguns festivais na europa para testar as novas canções. no primavera sound, no porto, foi possível confirmar essa ‘chegada à idade adulta’, com cada um dos elementos do trio – além de oliver (voz e baixo), romy madley croft (voz e guitarra) e jamie smith (beats e produção) – a assumir a importância da sua presença na formação.
apesar de permanecer sempre nas traseiras, emergindo só ocasionalmente do escuro, jamie tornou-se o maestro absoluto do grupo. romy, com o seu timbre aveludado, impõe maior intensidade nos jogos vocais com oliver, agora com uma voz mais grave e afinada, deixando para trás o antigo registo anasalado. ao vocalista cabe ainda a tarefa de comandar a plateia e mostrar que aquela fragilidade que definia os xx no início de carreia, entre 2008 e 2010, também se aperfeiçoou. ao vivo e em disco.
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deixar a casa dos pais
no novo coexist, oliver, romy e jamie apostam na continuação da sonoridade minimal pela qual ficaram conhecidos, mas fazem aquilo que parecia impossível. as canções são ainda mais esqueléticas, discretas e introspectivas do que as de xx, o disco de estreia, galardoado em 2010 com o mercury prize, o prémio mais importante da música no reino unido e que elege o melhor álbum do ano. pouco depois deste reconhecimento, e com dois anos de digressões com concertos quase sempre esgotados (incluindo em portugal), os xx decidiram parar e ‘virar costas’ à fama.
«a primeira coisa que fiz quando voltei para londres foi arranjar casa própria», conta oliver, reagindo ao nosso espanto (resultado de nos esquecermos que estamos a falar com um jovem de apenas 23 anos) por ainda viver com os pais. «comecei a viajar com 18 anos e só ia a londres alguns dias por mês. sabia que se não saísse logo de casa dos meus pais, ia ser tão confortável, a ser bem tratado e com comida boa, que ficaria até este álbum sair», justifica-se.
o começar a viver sozinho também foi influenciado pelo facto de oliver querer divertir-se durante uns tempos, antes de voltar a mergulhar no trabalho. «achava que só ia querer festa, mas assim que voltei a londres comecei instintivamente a trabalhar em novos temas. fazer uma digressão é muito duro e não é nada inspirador escrever sobre viajar de autocarro, a assistir ao mad men…».
da expectativa à experiência
este mergulho imediato na escrita de novas canções também o fez perceber que a música «não é apenas um trabalho». «é o que eu faço!», sublinha. oliver só se surpreendeu com a rapidez com que os novos temas apareceram.
«os nossos discos são concretamente sobre amor. mas quando temos 15 anos, a idade com que escrevi as canções de xx, por muito querido que seja, o que sabemos sobre isso? na altura escrevia sobre as minhas expectativas. desta vez, já tive experiências», diz oliver, frisando, porém, que isso não torna a escrita mais fácil. «é difícil ser super honesto. isso tira-nos algo. usei a escrita como uma libertação».
apesar dessa exposição amorosa, oliver realça que coexist não é um decalque biográfico da sua vida. até porque, nos três anos que separam os dois registos, a banda ganhou consciência de que a contenção tem um valor poderosíssimo no seu trabalho e essa é a característica verdadeiramente inata nos músicos: transformar o complexo em simples, nunca deixando de soarem sofisticados.
unidos fazem a força
o nome coexist (bem como o trabalho gráfico da capa) traduz bem a forma como oliver, jamie e romy pensam. «no início pensámos numa palavra simples, como together. mas na altura a romy estava a fazer pesquisas sobre trabalho artístico e gostou da maneira como quando a água e o petróleo caem no chão criam um bonito arco-íris, mas recusam a misturar-se, concordando apenas pacificamente em coexistir. isto reflecte bem o que nós somos: pessoas bastante distintas, mas que não conseguem fazer esta música separadamente», explica, acrescentando que, a par disso, gosta do facto de coexist ser «uma palavra negra, áspera e ambígua, tal como o amor pode ser às vezes».
esta reflexão quanto ao nome do disco não se estende, no entanto, ao processo de composição. «vamos para estúdio com pouquíssimas limitações. nunca há toneladas de ponderação e planeamento», assume o músico, salientando apenas uma regra de ouro: criar temas que consigam tocar ao vivo. «é por isso que não há vozes dobradas e uma imensidão de som», esclarece, enumerando a mais valia de cada um na formação: «as canções começaram todas num pedaço de papel. a romy fez os primeiros rascunhos, depois eu e ela trabalhámos o esqueleto das canções e o jamie envolveu-se a seguir. ele tem uma mente técnica muito forte e é muito bom a compreender a estrutura e a finalidade de cada elemento numa canção».
o resultado, conhecido mundialmente na segunda, são canções descarnadas, resultando desta nudez toda a sua beleza. tal como acontece em xx, cada tema possui o seu próprio tempo e espaço, com os ouvintes a serem convidados a entrar e admirar. e como oliver prometeu ao sol, até ao final do ano, o público nacional vai poder contemplar este universo tão singular ao vivo e a cores, com nova passagem da banda por portugal em data a anunciar.