‘O actual PGR foi o que teve mais poderes’

Não haverá reforço de poderes do PGR, em detrimento do Conselho Superior do MP. A sucessão de Pinto Monteiro continua a ser discutida.

há uma pergunta que todos fazem por estes dias: quem vai ser o próximo procurador-geral da república (pgr)?

essa é uma matéria inter-institucional (governo e presidente da república) e mal fora que uma matéria dessas fosse discutida na praça pública. o governo proporá seguramente alguém que compreenda o ministério público (mp) e com vontade de reforçar a sua autonomia. alguém que reponha não só as funções reais do mp como a sua própria dignificação e retire de uma vez por todas a ideia de politização desta magistratura. espero que, também depois de revisto o estatuto do mp, essa contaminação que tem ensombrado nos últimos anos a vida do mp não possa sequer ser posta em causa.

essa contaminação tem que ver com o desempenho do actual pgr?

não vou personalizar. creio que teve a ver com um circunstancialismo que levou à tentativa, muitas vezes por via legislativa, de funcionalização do mp. nós só seremos uma sociedade madura em termos de justiça quando as autonomias, as independências e também as responsabilidades forem apuradas.

o actual clima de divergências entre psd e cds e com o próprio ps pode prejudicar o entendimento?

estamos no âmbito de um programa de assistência financeira e ou há responsabilidade ou há irresponsabilidade. todos têm que ser responsáveis nesta matéria. se estivéssemos numa situação normal, é óbvio que se poderiam equacionar várias situações. neste momento, não. tem que se olhar para o país e ver o que significa a repercussão de uma situação que poderia ser de instabilidade e apelar a todos os portugueses, mais do que às coligações. tem que se fazer um apelo a todos nós pelo que podemos fazer pelo país. a responsabilidade de cada um de nós é tremenda. não é só do governo. mas entendo que há um discurso a fazer de explicação, não só do que está para trás como da forma de sair deste buraco rapidamente. ninguém quer cá a troika.

pinto monteiro defende há muito um reforço dos poderes do pgr, retirando-os ao conselho superior do mp. reconhece essa necessidade?

é sabido que tenho opinião contrária. eu não gosto de concentrações autocráticas. o actual pgr foi o que mais poderes teve na nossa história democrática, mercê das sucessivas alterações estatutárias, e não vejo nenhuma necessidade disso. vejo toda a vantagem é em ter um órgão de legitimação que mantenha os actuais poderes, assim como vejo toda a vantagem em que cada magistrado veja reforçada a sua autonomia, como recomenda o conselho da europa.

em muitas investigações importantes – como o furacão, o monte branco e a madeira -, o mp tem recorrido cada vez mais à gnr e à psp, pondo de lado a polícia judiciária (pj). o que pensa disto?

a pj não está afastada das grandes operações, como se vê pelas investigações conhecidas: as fraudes ao sns e à segurança social, o face oculta, etc.. basta ver todas as acções desenvolvidas pela pj este ano, para ver que nunca como hoje a pj tem feito tanto trabalho no combate à grande criminalidade. se me perguntar se a lei pode ser mais clarificadora, eu não penso que a pj esteja vocacionada para a criminalidade de menor impacto, pelo contrário. devemos estar todos orgulhosos da pj que temos. a nossa polícia é elogiada e medalhada no estrangeiro, mas não é reconhecida muitas vezes entre nós.

julgar um homicídio em 60 dias, como se prevê no futuro código de processo penal, não é ‘justiça a quente’, como dizem os juízes?

não. se alguém for apanhado em flagrante delito a matar alguém, o processo sumário pode ir até 90 dias e penso que não será difícil. de todo o modo, quer as partes quer o juiz podem pedir que seja convertido em processo comum. tudo está acautelado

paula.azevedo@sol.pt e helena.pereira@sol.pt