‘Violência doméstica não é problema privado’

As jornadas nacionais contra a violência doméstica, que arrancam esta quinta-feira, vão envolver quatro ministérios. O objectivo é fazer ‘aumentar a intolerância’ da sociedade em relação a estas situações. A secretária de Estado dos Assuntos Parlamentares e da Igualdade, Teresa Morais, pede ainda a aplicação de penas mais duras para os agressores.

o que são as jornadas nacionais sobre violência doméstica que se iniciam esta quinta-feira e que envolvem quatro ministros?

é uma iniciativa transversal em que vamos chamar a atenção da comunidade para este crime, para que aumente a nossa intolerância face a esta violência. continuamos a ter 29 mil queixas por ano e um número assustador de homicídios conjugais. por isso, vamos ter iniciativas com as polícias, para melhorar o atendimento às vítimas. é preciso reforçar a ideia de que a desvalorização de uma queixa pode ser fatal. vamos discutir as acusações e condenações com as magistraturas. tem crescido o número de condenações – temos 282 reclusos por crimes de violência doméstica, 80 dos quais preventivos –, mas os nossos magistrados, em muitos casos, não dão a devida importância à prática deste crime.

porquê?

as penas aplicadas são demasiado leves. há muitas penas suspensas e muitos crimes sem pena de prisão. vamos sensibilizar os profissionais do sns para reportarem as situações que se apercebam. na educação, é importante fazer um esforço porque nunca se apostou o suficiente na educação para a não-violência.

as mulheres continuam a ser as principais vítimas?

são as mais fustigadas. constituem 82% das queixas em portugal.

portugal está mais atrasado a esse nível que o resto da europa?

não. o problema é semelhante nos países da europa do sul. temos uma cultura de desigualdade entre homens e mulheres que facilita a violência. muitas vezes as mulheres são vistas como coisas, alguém em quem se pode mandar. por isso, a principal mensagem das jornadas é ‘por que é que continuamos a tolerar uma coisa destas e continuamos a fechar os olhos quanto ao que se passa na casa ao lado’? a violência doméstica tem custos sociais e económicos, tem custos na saúde e no trabalho. não é um problema privado.

numa altura de crise, as situações de violência não tenderão a aumentar?

há uma parte dos números que não tem a ver com a crise. de 2007 para 2008, passou-se de 20 mulheres mortas para 40. o que explica isto? não havia crise. esta pode interferir na apresentação da queixa, pois a mulher pode estar mais receosa, mas, quando se fala de mortes, não há ligação directa entre homicídios conjugais e a crise. portugal teve alternadamente anos em que as mortes duplicaram e voltaram a metade.

e as medidas de protecção à vítima?

têm sido uma prioridade absoluta. pela primeira vez, em 2012, a igualdade recebeu uma parte das verbas dos jogos sociais da santa casa, que serviu para o reforço dos núcleos de apoio à vítima. foi feito um reforço do programa de tele-assistência, em que a vítima tem um aparelho parecido com um telemóvel que acciona em situações de risco. há agora 100. e vamos fazer um contrato-programa para um transporte seguro das mulheres vítimas de violência para as casas de abrigo em qualquer ponto do país.

o governo pediu um levantamento sobre as mulheres em cargos de decisão. qual foi a conclusão?

os números provisórios dizem-nos que o sector empresarial do estado tem 27,2% de mulheres em conselhos de administração. a nível das empresas cotadas em bolsa, há 9,5%. entre as 20 maiores, existe 6,2%. quanto maior são as empresas, menos mulheres têm nos conselhos de administração, o que é triste.

é favorável a quotas para mulheres?

pessoalmente, sou. a comissária reading tem uma proposta de directiva nesse sentido: atingir 40% de mulheres em 2018 e 2020, no sector público e privado, respectivamente.

helena.pereira@sol.pt