os bancos têm ou não dinheiro para dar à economia?
a questão crítica é a do financiamento às empresas, porque nos particulares há menor consumo. as pessoas já não estão a procurar o crédito para a habitação. mas para as empresas, os bancos, uns mais do que outros, têm liquidez. e até querem dar crédito, porque é uma das formas de atacar o actual grande problema da banca: a falta de rentabilidade. já não é solvabilidade ou liquidez, como no passado recente.
e a forma mais rápida para aumentarmos a rentabilidade é dar crédito, porque se gera mais e melhor margem financeira. a questão é que as empresas não querem, porque dizem que o crédito está caro. e é verdade.
e por que é que os bancos não baixam os valores que cobram agora?
hoje em dia isso é muito difícil. o custo de funding dos bancos é muito alto e isso resulta de vários factores. por exemplo, no caso do bce há um mito que é preciso acabar de uma vez por todas. muitos dizem que se vamos buscar a 1%, então poderíamos vender a perto disso. é mentira, porque para se ir lá buscar dinheiro, têm de se deixar colaterais elegíveis e isso tem um custo de oportunidade, o que faz com que o financiamento custe afinal qualquer coisa como 3% ou mais.
mas depois ainda se cobram taxas de 7% ou 8%…
é que, além disso, os bancos têm um mix de captação que está ainda pressionado pela remuneração dos depósitos. em paralelo, há uma rigidez enorme nos balanços dos bancos, porque uma grande parte do crédito que lá está é hipotecário e de muito longo prazo: 30 anos, em média, com spreads baixíssimos.
isso afecta a margem financeira…
claro, e é essa a principal linha de receitas dos bancos. e nem sequer referi a usura que o estado pratica com os juros que cobra na recapitalização, de 8,5%. ainda bem que agora o ministro das finanças admite rever em baixa estes valores. acrescem a isto as elevadas imparidades do crédito malparado e desvalorização dos activos. tudo isto faz com que a banca tenha de emprestar a valores elevados.
a criação do good bank pode ajudar a resolver a situação?
sim. garantido por uma entidade supranacional, como o mecanismo de estabilidade europeu, pode ser uma das soluções para tornar o crédito mais competitivo. seria um veículo a que os bancos venderiam o crédito hipotecário, para ser colocado junto de investidores de longo prazo, como fundos de pensões internacionais. só por isto os bancos conseguiriam financiar as empresas a um preço mais baixo.
defende a criação de uma agência de financiamento em vez do anunciado banco de fomento. porquê? e por que é preciso uma nova instituição quando já existe a cgd?
a solução não pode vir da área de banca comercial, por estes problemas. mas também não precisamos de um novo banco, que é uma estrutura pesada e exige uma supervisão apertada e não é tão ágil. basta uma instituição financeira, e dentro do universo da caixa há know-how para isso. mas é uma actividade em que é preciso ter muito cuidado com a gestão.
porquê?
olhando para o passado, à conta do que se fez para fomentar as empresas fizeram-se grandes disparates. e temos, a todo o custo, de evitar repetir erros que levaram aos actuais níveis de imparidades.
têm sido noticiadas situações críticas de grandes empresários, como joe berardo, manuel fino, a própria família mello… têm muitos problemas destes?
não posso falar de casos de clientes, devido ao sigilo profissional. agora, de facto, cometeram-se grandes asneiras, do lado do crédito, muito motivadas pelo ciclo da economia que se vivia, muito concentradas no sector da construção e imobiliário, bem como no financiamento de ppp.
e muitas vezes as garantias dadas para esses empréstimos eram acções de empresas que hoje valem muito menos em bolsa…
exacto. e isso foi já um pouco mais do que um mero erro do momento. foi um erro claro de gestão financiar com base em acções. de todas as coisas más que se passaram na caixa, a que me faz mais confusão, pessoalmente, é ter-se usado o banco do estado para se fazer um assalto ao bcp. é inaceitável. porque há erros no crédito que têm de ser contextualizados no tempo, mas há outros que não têm essa desculpa.
a troika mostrou-se preocupada com o peso dos activos nos balanços dos bancos. estes novos fundos são o caminho certo?
sim, é algo de muito meritório, porque os bancos têm uma grande necessidade de desconsolidar. mas as coisas têm de ser bem feitas para que no futuro não se virem contra os próprios bancos. os fundos não podem servir como meros parqueadores de crédito.
antecipa um agravamento do malparado nos próximos tempos?
sim. continuamos a ver um aumento do ritmo do crédito malparado, que se vai manter pelo menos nos próximos meses, e que levará a que os bancos continuem a fazer imparidades.
as imparidades da cgd não são apenas de crédito, mas também muito dos activos, e há a indicação do accionista para o banco desinvestir nas áreas non core. como estão esses processos, nomeadamente as vendas da galp e da pt?
o conselho de administração tem executado esse mandato. vendemos agora os hpp, já vendemos também a cimpor e a zon, vamos vender os seguros e outras participações, mas não posso falar de casos concretos para o futuro.
como está a situação em espanha?
tem sido um grande problema, de facto, para a cgd, penalizando fortemente as contas do grupo. iniciámos um processo de redução e esperamos ter, em 2013, uma operação totalmente diferente. mas continuamos a querer estar lá. fora isto, a caixa tem uma plataforma internacional muitíssimo interessante, mas que teria a obrigação de aproveitar muito melhor. se for bem trabalhada, esta plataforma permite captar muito valor, até pelos fluxos internacionais de negócio que existem entre áfrica, américa latina, china e europa, onde a caixa está. e estou certo de que isso vai acontecer, até para compensar as dificuldades no mercado doméstico.
áfrica tem corrido bem?
tem sido um bom ponto de compensação.
à semelhança de outros bancos, estão a redimensionar a vossa rede de retalho em portugal?
sim, estamos a fazê-lo de uma forma moderada, porque temos de o fazer pelo contexto actual, tendo sempre em conta que a caixa tem uma função social.
e em termos de pessoas, a estrutura da caixa é a adequada ou faz sentido reajustar?
a caixa tem de continuar o caminho que está a fazer, aproveitando as pessoas quando encerramos agências, até porque temos departamentos, como o da recuperação de crédito, que está a precisar de pessoal. além disso, estamos com um plano de reformas de funcionários que vão sair nos próximos dois anos e não vão ser substituídos.