Matar o árbitro

O caso ocorreu na civilizada e rica Holanda e tem merecido pequenas notícias na imprensa mundial. Num jogo de futebol entre miúdos de 15 e 16 anos, um fiscal de linha, vulgo árbitro assistente, foi espancado até à morte.

quando o jogo terminou, os jogadores de uma das equipas cercaram-no e começaram a agredi-lo com socos e pontapés. viria a morrer no dia seguinte. o caso chocou o país, que iniciou um amplo debate com jogadores, treinadores e pais dos aspirantes a craques da bola. o ministro da justiça já culpou a federação e os clubes pela falta de normas e inexistência de valores na prática do futebol.

a tragédia torna-se ainda mais macabra quando se sabe que um dos filhos do fiscal de linha estava em campo e fazia parte da equipa que não se envolveu nos desacatos. rezam as crónicas que o jovem se sentiu impotente para acudir o pai e que a família o tem ‘afastado’ dos media para não o traumatizar ainda mais. neste fim-de-semana, mais de 800 mil jovens vão ficar em casa, pois os 33 mil jogos previstos não se realizarão.

os jogadores do nieuw sloten já tinham algum historial de arruaças e ninguém compreende a razão de a federação ter reduzido, num passado recente, a pena de suspensão para três anos para desordeiros perigosos.

as notícias não dizem se havia polícias nas redondezas, mas deduz-se que não. em portugal, as autoridades que regulam a prática desportiva do futebol decidiram recentemente acabar com a obrigação de haver polícias nos jogos dos regionais e distritais das camadas jovens. quem conhece o fenómeno do desporto juvenil não pode deixar de ficar preocupado com tal decisão. cada vez mais, há pais que vêem nos filhos uma garantia de um futuro melhor para a família. acham que serão um bom abono de família e, por isso, incutem-lhes valores completamente distorcidos. a competitividade ultrapassa tudo o que é aceitável e em simples jogos de crianças com 14 anos a agressividade vai muito para além do desejável. ainda há dias vi um treino das chamadas ‘escolinhas’ de um dos clubes grandes e fiquei estupefacto com os impropérios dos progenitores das crianças aquando de jogadas mais ‘disputadas’. também os treinadores não davam as melhores recomendações, já que exigiam às crianças um empenho semelhante ao dos adultos. para que em portugal não se viva uma situação semelhante à que ocorreu na holanda, seria bom que se começasse um amplo debate com clubes, treinadores, jogadores e pais dos pequenos craques antes de ‘correrem’ com os polícias dos jogos. é preciso dizer que o futebol é um jogo e não um investimento das famílias. l

vitor.rainho@sol.pt