Tiago Bettencourt: ‘Portugal é como eu, não se sabe vender’

Tiago Bettencourt iniciou-se na música há dez anos com os Toranja e agora lança Acústico, disco em jeito de best of que recupera êxitos da banda. Apesar do sucesso dos Toranja, que além de elogios também somou alguns ódios, o músico diz que nunca aprendeu a construir a imagem pública certa para si.

tiago bettencourt admite que, desde que os toranja acabaram, há seis anos, tem sido um pouco egoísta. na sua carreira a solo apostou numa música «que precisa de tempo para ser ouvida», o que, numa «época em que a comunicação é tudo» e em que o artista tem «de saber passar a sua mensagem estupidamente rápido», torna a sua sonoridade ainda mais exigente.

com dois álbuns a solo – o jardim (2007) e em fuga (2010) – intimistas em relação ao trabalho que desenvolveu nos toranja, tiago bettencourt admite ser «perito» a fechar-se muito no seu próprio universo, menos óbvio para públicos mais abrangentes. «nesta época em que a internet é tão importante, o artista tem de ter uma postura mais aberta, passar muito tempo no facebook e no twitter a dizer o que está a fazer e a tirar fotos de si próprio. eu ainda não percebi muito bem como consigo funcionar assim, sem comprometer aquilo que sou», comenta.

por isso, agora que lança o seu terceiro disco a solo, acústico (mantendo, como sempre, a companhia da sua banda de suporte, os mantha), o músico resolveu ‘redimir-se’ por ter estado nos últimos anos «mais fechado», sobretudo «daquele público que só ouve o que a televisão ou a rádio lhe dá» .

em jeito de best of, acústico «é um álbum muito pouco egoísta, com um alinhamento de hits. são as músicas que o público mais acarinhou e continua a pedir», comenta. entre elas estão ‘carta’ e ‘laços’, dois dos temas mais populares dos toranja e que tiago continua a ter de tocar nos concertos porque, apesar da vida curta da formação, «foi uma banda que marcou muita gente».

quando surgiram, com o álbum esquissos, os toranja alcançaram um sucesso instantâneo e, consequentemente, tiago bettencourt passou a estar nas ‘bocas do mundo’. mas, da mesma maneira que o músico recebia rasgados elogios do público, também se assistiu a uma ‘campanha de ódio’ contra a banda. «acho que embirravam connosco só porque tínhamos sucesso e vendíamos discos. era uma selvajaria, especialmente na imprensa de música que dizia mal gratuitamente. havia muita inveja e alimentou-se aquela ideia ‘se está a vender é porque não presta’», menciona tiago.

apesar do sucesso, a banda separou-se em 2006, sem dar grandes explicações sobre a ruptura – «tínhamos ideias diferentes em termos de composição», diz agora o vocalista –, mas tiago garante que «tem muito orgulho» no que os toranja fizeram. «assumo a fotografia que tirámos naquele momento», reforça. «hoje sei que não teria a liberdade que tenho se os toranja não tivessem tido sucesso».

é essa liberdade que lhe permite viver «sem queixas» da música em portugal, mesmo com a frustração permanente de não conseguir furar fronteiras. «portugal é como eu, não se sabe vender. somos um país muito pequenino que não sabe exportar a própria música, a não ser que seja fado», diz, comparando o fenómeno com a sua incapacidade de se autopromover nas redes sociais. «há artistas novos que, mais do que músicos, parecem que têm um curso de marketing em cima. isso faz-me impressão porque têm sucesso e, no fundo, a comunicação quase se sobrepõe ao produto final».

para fugir a este ambiente «claustrofóbico» que sente, de tempos em tempos, em portugal, o músico sente uma necessidade cíclica de partir. como adora música africana, há três anos viajou com um amigo, durante um mês, para o mali. mais recentemente, elegeu as paisagens orientais do laos para repetir a experiência, desta vez sozinho. «as viagens fazem-me bem para acalmar. é bom sair e ter a noção de mundo. quando se fala com um artista que trabalha para o mundo e outro que só trabalha para portugal, nota-se a diferença na quantidade de ar que eles têm no peito». e salienta o lado terapêutico destas aventuras pelo mundo. «o que mais gosto é de viajar e custa-me muito não poder ir tocar rock português a inglaterra ou aos estados unidos. a solução é continuar a trabalhar, porque já conquistei algo num país estupidamente pequeno. e continuar a viajar, porque as viagens acalmam esta frustração».

alexandra.ho@sol.pt