Clique ao prémio

Começou e acabou o dia a ganhar. Um perfume, bilhetes para o cinema, um DVD, acessórios de moda, entradas para um concerto e, arrumadas as contas, ao fim de uma memorável terça-feira, Flávia Hora juntava a uma já extensa colecção de prémios, uma mão-cheia de novos troféus.

o segredo? «participar em quase tudo o que é passatempos», revela esta portuense, fidelizada aos concursos online desde que, no início do ano, se viu empurrada para o desemprego. «passei a estar mais atenta ao facebook, aos blogues, às páginas das marcas, e percebi que através da internet poderia conseguir uma série de coisas de graça».

primeiro apenas para uso pessoal, depois já a pensar em ofertas para familiares e amigos, flávia não perde uma oportunidade de navegar em busca de novos prémios.

pôr os prémios a render

«às vezes uso os dados dos meus pais, irmãos e sogros para aumentar as hipóteses de ganhar», conta esta incansável concorrente, já versada na arte de tirar partido das regras para multiplicar os ganhos. «no outro dia havia um passatempo no facebook em que os primeiros 300 inscritos recebiam umas bolsas de silicone todas giras. tive direito a seis porque depois de participar com o meu nome, como tenho a password dos meus familiares, também me inscrevi por eles».

o engenho, que a ex-funcionária do sector fabril faz questão de legitimar – «não é considerado batota» –, permite não só despachar presentes, como serve de moeda de troca num espaço de negócio online (facebook.com/obazardavanda).

«por um lado poupo porque deixo de comprar muita coisa, por outro lado encontrei uma forma de ganhar mais qualquer coisa».

mas, contrapõe joana, a maioria dos prémios estão longe de ser favas contadas. «já ganhei muita coisa, é verdade, mas também participo em muitos passatempos e fico meses sem ganhar nada», nota a estudante. contraria, contudo, a «ideia feita» de que é quase impossível entrar para o clube dos vencedores. «se as pessoas não tentarem nunca vão ganhar».

em jogo, além de um sem-número de produtos de utilização diária – «chego a estar algum tempo sem precisar de comprar cremes», conta joana –, está o acesso a produtos de outra forma excluídos, ou pelo menos adiados, dos planos de consumo. como uma máquina de lavar roupa e uma estadia num hotel de charme para duas pessoas, ofertas que lideram o ranking de ganhos da estudante, actualizado à medida das melhores oportunidades. «tenho uns quatro ou cinco sites que consulto sempre que posso e que me mantêm a par da maioria dos passatempos, mas participo apenas quando o prémio me agrada».

perfumes, gadgets e futebol

o processo de selecção, que volta e meia se cumpre também através de desafios no facebook e partilhas na blogosfera, já poupou a carteira de joana a tantos gastos que o balanço das participações em passatempos é inequívoco. «sinceramente, perdi a conta aos prémios».

de perfumes e malas a livros e bilhetes de futebol, a galeria de troféus da estudante está nos antípodas da montra de ganhos de josé carlos nunes, uma espécie de campeão especializado na categoria gadgets.

«tornou-se tão habitual concorrer e vencer que, além de me perguntarem ‘o que ganhaste hoje?’, tenho colegas que me pedem ajuda para outros passatempos». pode ser uma achega para uma frase, uma ideia para uma produção fotográfica, ou a inspiração para um vídeo – reza a história que quando josé entra em competição raramente sai de mãos a abanar. com uma pose de praia, por exemplo, o técnico de electrónica arrecadou um computador, enquanto um par de planos de filmagem já lhe rendeu uma máquina de filmar e um televisor lcd, avaliados em 2.000 euros cada. no balanço dos ganhos online, dominado por novidades multimédia e artigos de informática, os cliques vencedores medem-se também por vales de compras, onde se incluem 1.500 euros de orçamento para uma viagem.

«levei a família à eurodisney por quatro dias», recorda este pai de duas crianças, de volta ao resultado de um desafio de verão: ‘o que farias se fosses para uma ilha deserta?’. ao desafio da marca promotora do passatempo – especializada em águas –, o portuense respondeu com fotografias inspiradas em litros. «mandei um carregamento de garrafas de água para a ilha».

mais recentemente, no embalo do passatempo ‘solta o realizador que há em ti’ – do site de classificados olx –, josé amealhou 100 euros com um vídeo de menos de dois minutos de duração.

adiar compromissos em troca de prémios

«acho que tenho um lado criativo que acaba por se evidenciar nos passatempos», diz o técnico de electrónica, especialista em transformar fotos e vídeos em prémios de milhares de euros. «vale a pena investir numa ideia quando há um júri a votar», aconselha, desmarcando-se da regra que faz a praxe das competições no facebook: os likes.

«o esforço não é valorizado porque, no final, ganha quem consegue juntar mais cliques», explica josé, acompanhado por flávia nas objecções. «não gosto de chatear amigos e conhecidos para conseguir um prémio», diz a portuense, por norma disponível apenas para desafios que envolvam o envio de fotos ou de frases, e ainda rapidez na participação. fora de jogo, além das campanhas de angariação de likes no facebook, ficam os cliques capazes de congestionar até as agendas mais desafogadas.

«há passatempos que são uma verdadeira loucura, porque definem horários específicos para responder», assinala flávia, consciente dos excessos das inscrições com hora marcada. «corremos o risco de viver em função dos concursos».

mais do que isso, acrescenta carla, esta relação de dependência ganha terreno como uma alternativa de vida. «é uma necessidade. se não temos dinheiro para comprar aquilo de que precisamos, por que não tentarmos a sorte nos passatempos? são grátis e podem ser muito úteis, sobretudo para aliviar a factura do supermercado».

sempre atenta a passatempos que oferecem como prémios vales de compra – «20 euros aqui, 50 ali, sempre dão uma ajuda» –, a operadora de call center também não perde uma oportunidade de coleccionar amostras. «não acho que o meu caso seja dos piores, mas confesso que já adiei compromissos para ter a certeza que seria das primeiras a responder». além de apostar nas marcações de relógio, compensadas na maioria das vezes por produtos de beleza, carla investe um par de horas diárias numa espécie de caça ao prémio. «analiso as newsletters das marcas que têm os melhores passatempos, consulto os sites especializados e, de uma forma geral, entro em todos». participar é a regra número um para ganhar.

paula.cardoso@sol.pt