há dois anos lançou my path só em formato digital, para download gratuito. porquê?
foi a melhor decisão que podia ter tomado naquela altura. se não tivesse sido gratuito, não teria a exposição que tive ou, então, demorava muito mais tempo a chegar às pessoas. alcancei muito rapidamente os 10 mil downloads e isso influenciou, naturalmente, os números no youtube [‘that’s how we roll’ tem mais de um milhão de visualizações] e de pessoas que começaram a aparecer nos concertos. acho que foi uma jogada perfeita.
hoje um artista tem de saber ‘jogar’, sob pena de não sobreviver no mercado actual?
como sabemos, as vendas de discos hoje em dia traduzem-se em muito pouco lucro. o objectivo máximo de qualquer artista que está a começar é que as pessoas conheçam as suas músicas para, depois, irem aos concertos. é aí que se ganha dinheiro.
em my path aposta no reggae. focused segue a mesma linha musical?
sim, este disco é parecido com o primeiro, numa mistura de reggae e soul. parte do disco foi gravado na alemanha, com a equipa do gentleman [um dos mais conceituados músicos actuais de reggae], por isso tem muito mais qualidade que o primeiro. na europa não há ninguém melhor a gravar este estilo. mas acho que há músicas para toda a gente. a primeira metade do álbum é mais calma, mais abrangente. a segunda metade já é para os fãs mais hardcore de reggae.
como nasceram estas canções?
no reggae acontece muito os produtores mandarem instrumentais completos. neste álbum, a maior parte dos instrumentais que recebi foram dessa gente do gentleman e, depois, trabalhei ideias por cima. normalmente quando recebo um instrumental, oiço aquilo sem parar e depois vão-me surgindo ideias, letras, melodias… mas também compus algumas coisas com a minha banda.
o reggae não tem muita tradição em portugal. porquê cantar este estilo?
hoje em dia, o reggae já é quase mainstream em portugal. já há, inclusive, festivais de verão só de reggae, como o sumol summer fest, com 15 mil pessoas. mas eu comecei a ouvir por causa da minha mãe. ela cresceu em inglaterra e, tal como nós ouvimos muito música cabo-verdiana, brasileira, etc., eles lá também absorveram imenso a música dos imigrantes das caraíbas. a minha mãe chegou a ver um concerto do bob marley em inglaterra e quando ela regressou a portugal trouxe essas influências. comecei a ouvir bob marley desde bebé.
no primeiro ep homónimo trabalhou com kimani marley, filho de bob marley. como foi essa experiência?
o facto de ter trabalhado com um príncipe do reggae – porque é isso o que os marley são, a realeza do reggae – é uma honra e permite-me usar isso para fazer contactos e promover melhor o meu trabalho no estrangeiro.
ainda está a começar e já pensa numa carreira no estrangeiro?
portugal é muito pequeno e às vezes sinto que as pessoas fartam-se com muita facilidade das coisas. por isso, também adorava conseguir ter uma carreira lá fora para poder deixar as pessoas respirar.
é por isso que também só canta em inglês?
quero ser o melhor no que faço, logo, para estar na linha dos melhores, tenho de cantar em inglês porque o mercado do reggae é internacional. mas a verdade é que também nunca aprendi a escrever letras em português. além de falar inglês desde pequeno em casa, não tenho um background de música portuguesa. o que me influenciou foi o reggae, o soul, o blues, otis redding, stevie wonder, wilson pickett… já tentei fazer músicas em português, mas nunca me soaram bem.
que fascínio é esse pela chamada black music?
quando era miúdo, uma das primeiras músicas que aprendi a cantar era de um artista chamado sisqó. ele era muito piroso, mas tinha uma voz brutal e eu sempre adorei vozes negras. eles cantam melhor do que nós, temos de admitir. se compararmos a black music com a ocidental, a nossa é muito mais técnica e a deles mais emotiva. e eu prefiro a emoção à técnica. às vezes, há artistas que não cantam nem tocam muito bem, mas a emoção que passam é arrepiante. acho isso fascinante.
já foi à jamaica duas vezes. era um sonho antigo?
ia com medo porque já me tinham dito que aquilo não era o paraíso que se via nas fotografias e nos videoclips do bob marley. mas a coisa engraçada que me lembro de ter sentido é que cheguei lá e, como já sabia falar jamaicano (uma espécie de crioulo inglês) por causa das letras, senti-me logo em casa. claro que eles estranham imenso ver um branco a falar jamaicano e a dizer que canta reggae. a reacção inicial é não acreditarem em ti, mas nesse aspecto também tive uma surpresa. quando fomos à jamaica gravar o teledisco do ‘that’s how we roll’, no início de 2012, consegui uma entrevista na rádio local e o dj que estava a fazer o programa puxou a minha música para trás. na jamaica, quando eles gostam da música, é muito comum ouvirem-na do princípio outra vez. ele fez isso cinco vezes.