Karel Schwarzenberg: Príncipe presidencial

Os checos estiveram próximos de voltar a colocar um nobre no Castelo de Praga, mas Karel Schwarzenberg acabou por ser derrotado na segunda volta das presidenciais da semana passada

tem tempo para ler este nome? karel johannes nepomuk joseph norbert friedrich antonius wratislaw menas fürst zu schwarzenberg. assim se chama o homem que esteve perto de fazer regressar ao poder na república checa uma das famílias mais influentes e abastadas do antigo império austro-húngaro.

a segunda volta das eleições deste mês acabou por ditar a vitória do rival pós-comunista milos zeman, mas foi schwarzenberg quem chamou a atenção da imprensa internacional devido ao seu perfil colorido. numa era de políticos formatados, não é todos os dias que surge um homem de bigode, laço, cachimbo e casaco aos quadradinhos. mas karel, como gosta de ser chamado, um checo rico e estrangeirado, tratou de afastar a aura aristocrata e elitista e apresentou-se ao eleitorado como um homem do povo. na recta final da campanha, surgiu mesmo retratado com uma crista punk cor-de-rosa numa tentativa de conquistar o eleitorado mais jovem e urbano.

e conseguiu-o. não foi o suficiente para vencer a eleição (zeman teve 55% dos votos), mas foi o candidato mais votado em praga.
mas o lado aristocrata e elitista do membro do clube bilderberg também existe. nascido príncipe numa checoslováquia republicana em 1937, karel e a família suportaram o período nazi mas fugiram ao comunismo em 1948, para a suíça. com passaportes helvéticos, os schwarzenberg instalaram-se depois em viena de áustria, onde karel cursou direito e agronomia.

foi a partir dos alpes que o príncipe checo desempenhou um importante papel na luta internacional contra o comunismo, sobretudo após a primavera de praga. militou no partido conservador austríaco ovp, onde foi várias vezes visto como um potencial chefe da diplomacia de viena, e liderou o comité internacional de helsínquia para os direitos humanos, em nome do qual recebeu nos anos 80 o prémio do conselho da europa para os direitos humanos.

uma mulher, dois casamentos

karel casou por duas vezes com uma condessa austríaca, teresa. primeiro em 1967, até ao divórcio em 1988, e por uma segunda vez em 2008. pelo meio teve três filhos. um deles com um nome ainda mais longo que o do pai – johannes nepomucenus andreas heinrich joseph karl ferdinand johannes evangelist die heiligen drei konige achaz michael maria – e outro, karl, que acabou adoptado por um político austríaco de extrema-direita que, diz a imprensa cor-de-rosa, será o pai biológico do jovem.

a queda do muro de berlim leva karel de volta a praga, onde se torna chefe da casa civil do presidente vaclav havel, seu amigo de longa data. para trás ficam teresa e os filhos, que não falam sequer a língua eslava do pai (o próprio karel fala um checo arcaico frequentemente ridicularizado pelos concidadãos). foi depois senador, e no exercício desse cargo voltou a desafiar um regime comunista. em 2005, viajou até cuba para reunir com um grupo de dissidentes, mas as autoridades castristas acabariam por expulsá-lo do país antes que o encontro tivesse lugar. «atitude típica de um estado totalitário», comentou karel aos microfones da imprensa internacional.

o príncipe voltaria às lides diplomáticas, agora pela porta grande, sendo ministro dos negócios estrangeiros da república checa desde 2007, eleito por um partido conservador. desempenhou o cargo com um sentido de independência invulgar, fazendo orelhas moucas aos apelos do seu próprio governo para que não afrontasse os gigantes russo e chinês – karel ignorou as recomendações e declarou o seu apoio às pussy riot e ao dalai lama.

chegado às eleições, karel surpreendeu ao praticamente duplicar nas urnas o número de votos que as sondagens lhe atribuíam para a primeira volta. em parte, pela independência em relação a um sistema político-partidário que, ao cabo de duas décadas de democracia, encontra-se perto do esgotamento. por outro lado, como referia uma eleitora checa de 25 anos ao new york times, porque sendo já rico, seria menos vulnerável à corrupção. mas sobretudo por um voto de simpatia para com um homem que adormece em debates televisivos. «adormeço porque os outros candidatos só dizem disparates», justificou depois de uma curta soneca em directo.

na segunda volta, e apesar do apoio em massa do eleitorado urbano, os checos rurais e economicamente deprimidos acabaram por eleger zeman, um defensor dos direitos sociais. em todo o caso, e tal como karel, um europeísta que vem afastar o fantasma de vaclav klaus, o anterior e polémico chefe de estado que comparava bruxelas a moscovo e que negava o aquecimento global. karel, até ver, continuará a ser o popular chefe da diplomacia checa. e o futuro à história pertence.

pedro.guerreiro@sol.pt