assim que fernando casqueira lança uma ideia, luís filipe borges completa, intuitivamente, a frase. e vice-versa. se é o apresentador de 5 para a meia noite a iniciar um tema, o professor rapidamente pega na deixa do parceiro para, sem pausas, a reforçar. esta química entre os dois parece uma relação trabalhada durante muitos anos, mas na realidade a dupla conheceu-se há menos de um ano, quando se juntou, por acaso, para o primeiro casting de conta-me história, o programa que agora ocupa o horário nobre das noites de quinta-feira da rtp.
«o produtor do programa pediu-me, por amizade, para decorar duas cenas para conseguir realizar o casting a quatro historiadores. nesse dia houve um rapport imediato com o professor casqueira e ficou claríssimo que tinha de ser ele», explica borges, acrescentando que o seu papel «estava pensado para outra pessoa». até a direcção de programas ver as gravações dos castings e comentarem «‘por que não faz o borges?’». «fui parar ao programa assim», diz.
nas palavras dos intervenientes, conta-me história é um formato que «mistura um lado profundamente didáctico com uma mecânica pop». a ideia, comenta o consultor histórico, é explorar em cada episódio um acontecimento relevante na história do país, «com uma cenarização, ludicidade e factos que os portugueses, em geral, não conhecem».
«houve a preocupação de trazer estórias dentro das histórias», reforça fernando casqueira. e borges continua: «vamos encontrar muitos heróis sombra, muitas pessoas que, nos bastidores, foram os principais responsáveis pelas movimentações. como por exemplo, o álvaro pais e a sua relação com o mestre de avis. ele era o grande estratega». ou, sublinha o professor, «o papel decisivo do secretário particular do futuro rei d. joão iv».
dos oito episódios gravados para a primeira temporada (que se prolonga até março), abordam-se temas como a ida da corte para o brasil, a crise dinástica de 1383-85, o terramoto de 1755, o período filipino e a restauração de 1640, o regicídio, a regeneração («um período muito pouco estudado», considera o professor), a descoberta do brasil e a fundação da nacionalidade. por cada um destes temas poder «ser analisado de maneira autónoma, sem estarem encadeados no tempo», diz o consultor histórico, optou-se por não construir o programa de forma cronológica.
por ter uma formação «muitíssimo transversal» – entre outras matérias, estudou psicologia, antropologia e sociologia – e se considerar um investigador em vez de historiador, fernando casqueira considera «toda a história conjectural», sobretudo a portuguesa. «perderam-se imensos documentos em portugal. ainda há caixotes na torre do tombo por abrir. com os incêndios, os filipes, as invasões francesas, a revolução liberal, etc., os acervos foram-se perdendo. há todo um processo de investigação por fazer», considera.
nesse sentido, conta-me história, diz o professor, actualmente a leccionar nas universidades lusíada e lusófona, «é um bom instrumento de divulgação». «não estamos a falar para historiadores, mas sim para a população. desde seniores, pessoas com responsabilidade neste país que sabem muito pouco de história, até aos jovens», salienta, revelando que, pessoalmente, o maior desafio foi habituar-se a ver-se na caixinha preta. «achei-me idiota», diz.
já luís filipe borges não encontrou grandes dificuldades em relatar momentos da história, porque, em 1995, quando fez os exames específicos para concorrer à faculdade, foi o aluno com a «melhor nota do país» na disciplina. «sempre foi uma das minhas disciplinas favoritas», afirma, salientando que juntar essa paixão ao prazer de fazer televisão fazem de conta-me história um dos projectos em que mais gosta de estar.