«ainda parece um sonho», diz daniel rodrigues ao sol. a resposta pode soar a cliché, mas tal como nos sonhos, a última semana do jovem fotojornalista português assemelhou-se, de facto, a uma fantasia difícil de imaginar de olhos abertos. ainda assim, foi bem acordado que daniel recebeu a notícia de que é o vencedor, na categoria de vida quotidiana, de um world press photo (o prémio equivalente a um óscar na área do fotojornalismo e que já tinha consagrado três portugueses antes: eduardo gageiro, em 1974, carlos guarita, em 1994, e miguel barreira, em 2007).
mais do que a recompensa monetária – de 1.500 euros – é o prestígio e o reconhecimento internacional que doura esta distinção. especialmente quando há alguma ironia pelo meio. em portugal, o fotógrafo nunca conseguiu publicar a reportagem e, quando tentou organizar uma exposição para mostrar o trabalho, também não teve a aceitação das galerias a que bateu à porta. mas há uma semana, assim que o prémio foi anunciado, «um espaço que não tinha disponibilidade para receber» as fotografias de daniel, já lhe ligou a perguntar quando quer realizar a mostra.
apesar de lamentar «a pouca aposta no talento» nacional, o jovem, de 25 anos, natural de vila nova de famalicão, prefere concentrar-se nas coisas positivas que aconteceram esta semana. uma delas foi voltar a ter material fotográfico, uma vez que o antigo, com o qual viajou para áfrica, foi vendido há meses para «pagar contas». «a canon portugal ofereceu-me uma 5d mark iii e uma lente, e o banco espírito santo [que organiza anualmente o bes photo] também me deu material», revela ao sol. mas as ofertas não se ficaram por aqui. em solidariedade com a situação precária de daniel, que está desempregado desde setembro, foram vários os anónimos que o contactaram para lhe oferecer as suas máquinas pessoais, desde «analógicas a compactas». «tem sido uma loucura. abro o facebook e tenho mais de 50 mensagens por dia para ler. grande parte é a dar-me os parabéns e, depois, há pessoas que, mesmo não tendo máquinas profissionais, querem ajudar-me com o que podem», diz, agradecido.
daniel rodrigues vai receber o prémio em abril, em amesterdão, mas antes disso, daqui a duas semanas, parte novamente para áfrica. tal como há um ano, quando visitou pela primeira vez «o continente dos» seus «sonhos», a expedição será feita como voluntário da missão dulombi, que presta apoio humanitário à guiné-bissau. desta vez, além da máquina fotográfica, na bagagem também seguem várias impressões da imagem que venceu o world press photo «para distribuir entre as crianças» que jogam à bola. e leva também a esperança de conseguir registar mais momentos como aquele. «é inevitável fotografar a desgraça, mas também é importante mostrar que áfrica não é só isso. também há paz e alegria, como acho que a minha fotografia mostra».
alexandra.ho@sol.pt