da última vez que patrícia guedes foi a um restaurante chinês, começou a sentir «um mal-estar geral, a nuca rígida, dores de cabeça e a cara a ficar vermelha». os sintomas apareceram cerca de meia hora depois da refeição. apesar de não ter sido a primeira vez que se sentiu mal depois de uma refeição chinesa, patrícia, de 41 anos, nunca associou os sintomas a uma alergia alimentar.
«cerca de 30, só no último ano», adianta o alergologista antero palma carlos acerca do número de casos de síndrome do restaurante chinês (src) que atendeu no seu consultório. apesar de ser pouco conhecida, a src pode estar na base de muitas indisposições alimentares para as quais as pessoas não encontram justificação.
sara sampaio costumava frequentar restaurantes chineses com patrícia, de quem é amiga. até começar a notar os mesmos sintomas: «começo a ficar com a zona das bochechas e do nariz dura e dormente; sinto um mal-estar geral e fico com uma ligeira dor de cabeça na zona da testa». estes sinais acabam por desaparecer «ao longo da digestão», explica ainda a vítima desta alergia alimentar.
por razões óbvias, patrícia diz que tem vindo a comer cada vez menos no restaurante chinês, enquanto sara afirma categoricamente que não pretende voltar mais.
mas o que provoca estes incómodos? a src resulta de «um conjunto de sinais e sintomas atribuídos ao consumo de glutamato monossódico, reconhecido pela food and drug administration [organização americana responsável pelo controlo alimentar e de medicamento] como seguro para a população, não se justificando a retirada do mercado», explica helena pité. em linguagem comum, trata-se de «um sal universalmente utilizado na indústria alimentar como intensificador de sabor».
o problema pode estar nas quantidades adicionadas deste aditivo. por isso palma carlos acredita que o seu uso deveria ser limitado. já o nutricionista humberto barbosa, autor de estudo sobre alergias alimentares, considera que «a presença [deste sal] em alimentos deve estar visível para que o consumidor seja informado e possa ele próprio tomar a decisão de ingestão ou não».
«cansaço, mal-estar geral, dor de cabeça, alterações da pele, desconforto abdominal, palpitações» são os sintomas mais comuns associados a esta síndrome, refere a médica especialista em alergias. os sintomas desaparecem espontaneamente ou através de tratamento. «não há evidência que comprove efeitos a longo prazo», garante ainda helena pité.
palma carlos, por sua vez, diz que a src manifesta-se através de «dor de cabeça por vasodilatação» e que as pessoas mais susceptíveis a esta síndrome são «crianças com baixo peso, idosos com tensão arterial elevada e pessoas com tendência a terem cefaleias».
humberto barbosa refere ainda que os indivíduos com «com perfil de atopia ou intolerância generalizada, ou com algumas dificuldades de base a nível gastrointestinal» também são passíveis de apresentarem os sintomas.
a ligação entre o glutamato monossódico e a src foi feita, pela primeira vez, no final dos anos 60 do século xx. todavia, «vários estudos falharam na tentativa de demonstrar uma ligação entre a ingestão de msg [glutamato monossódico na sigla inglesa] e a síndrome de restaurante chinês», garante humberto barbosa.
helena pité refere que «as queixas não têm que ocorrer necessariamente em restaurante chinês ou após ingestão de comida chinesa». ainda que mais utilizado na cozinha asiática, este sal é também utilizado em alimentos como «carne e peixe congelados, sopas enlatadas e temperos para saladas», especialmente em comidas pré-feitas. mário jorge santos, presidente da associação dos médicos de saúde pública, salienta que quando o consumo do glutamato é feito «através de outras comidas, não costuma haver queixas».
os cerca de 1,8% da população que reagem a esta substância é porque têm uma hipersensibilidade à mesma. helena pité aconselha quem revele alguns dos sintomas descritos a fazer uma avaliação clínica com médicos alergologistas. o glutamato monossódico não é o único responsável por este tipo de reacções. os sintomas, adiante pité, «podem ter origem noutros aditivos alergénios alimentares, podendo ser graves».
