faltava, porém, a ‘cereja em cima do bolo’ de entre os vários ‘retornados’: o reaparecimento de josé sócrates, actual consultor de uma multinacional farmacêutica, deputado eleito e ex-primeiro-ministro que entregou o país às mãos da troika, à beira da bancarrota.
noutras latitudes, os ex-presidentes ou ex-primeiros ministros ganham a vida como conferencistas, por norma bem pagos.
por aqui, com as excepções conhecidas, as televisões carentes de audiências acham que é uma boa ideia contratarem ex-governantes, para branquearem o passado e criticarem acidamente os sucessores. a rtp é o caso mais recente. e mais chocante.
sabia-se que sócrates, decerto muito folgado com as aulas em paris, continuava a promover tertúlias em lisboa, juntando os seus apaniguados, com o zeloso projecto de influenciar o destino do seu partido. a saída em falso de antónio costa é um bom exemplo do que foi tentado, com o apoio ‘socrático’. saíu-lhe mal e, à cautela, costa já veio demarcar-se e dizer que foi uma ‘má ideia’ o convite da estação pública…
de facto, o ‘tempo de antena’ que a rtp vai oferecer a josé sócrates ofende o eleitorado que o afastou nas urnas – e todos os contribuintes que suportam, estoicamente, a austeridade provocada pelos desmandos dos governos que liderou.
além disso, é um desafio lançado à cara de três protagonistas: passos coelho, antónio josé seguro e cavaco silva.
se isto faz parte de um plano ‘maquiavélico’ de alguém, com o beneplácito de um ministro que não sai pelo seu pé, constitui o perfeito hara-kiri de um governo que deve ter desistido de governar.
sejamos claros: é já delirante que as televisões paguem cachets a políticos para fingirem que são comentadores, e os promovam como ‘estrelas’ de entretenimento.
mais grave é que seja a estação pública a tomar a iniciativa, à pala de um pluralismo néscio, dando fôlego a um homem que tem um défice de memória e contas a prestar ao país.
sejam quais forem as suas motivações ou ambições – e petições públicas aparte –, o despudor de sócrates pode ser uma oração fúnebre para a coligação.
porque ele sabe que foi, também, a rtp que o alavancou (e a santana lopes) para alcançar o poder. e percebe, como chávez percebia, que a televisão é um poderoso meio para manipular as massas, sobretudo se atarantadas e de bolsos mais vazios.
autoritário, hábil no uso da palavra, com domínio apurado das técnicas de marketing político e de comunicação, sócrates vai ocupar o palco com a lição estudada e não lhe faltarão os prosélitos do costume.
com um governo fragilizado, uma oposição sem ‘golpe de asa’ e um país assustado com as incertezas próprias e alheias do coro dos aflitos, o reality show de sócrates arrisca-se a ser um remédio amargo. duvida-se que esta publicidade seja uma mais-valia para a farmacêutica que lhe deu emprego…
