Luísa Sobral: ‘A felicidade parece-me demasiado banal’

Com o primeiro álbum atingiu o disco de platina, viajou pelo mundo e foi ao consagrado programa da BBC Later… With Jools Holland. Luísa Sobral lançou na semana passada o segundo registo de originais e reconhece que There’s a Flower in My Bedroom é mais melancólico porque gosta de encontrar beleza na solidão e na tristeza. O…

costuma dizer-se que o segundo álbum é a prova dos nove de um músico. isso pesou na concepção do disco?

não penso muito nessas coisas. compus tantas canções ao longo dos últimos dois anos que já só as queria gravar. essa vontade era maior do que o medo da reacção das pessoas. gosto mais deste disco, talvez também por ser novo. acho-o mais maduro do que o anterior e gosto mais destas personagens e destas harmonias.

mas antes não tinha nada a provar e agora há expectativa. nunca deixa o nervosismo entrar noestúdio?

o stress que possa existir tem sempre mais a ver com o medo de desiludir a minha equipa do que o que vão pensar do disco. e durante as gravações penso sempre muito mais nas canções. se me deixasse enervar com a expectativa, esse stress ficava cada vez maior, e eu só queria direccionar a minha energia para a gravação. como estou realmente feliz com as canções, estou pronta para defender o meu trabalho.

o novo registo mantém a sonoridade da estreia, mas as histórias são mais adultas. há inocência, mas é menos infantil. é um reflexo do crescimento enquanto artista?

sim, espero ter crescido um bocadinho… [risos]. não procurei essa seriedade propositadamente, mas o facto de a minha vida ter mudado – comecei a dar concertos, a viajar, a estar mais exposta a outros estímulos – fez com que começasse a ter outras inspirações. há dois anos o meu objectivo era viver da música e agora vivo de facto. tenho tempo e espaço para me dedicar exclusivamente ao meu projecto.

não se cansa de si?

ai não, não me canso… claro que sim! não leio as minhas entrevistas, não vejo os meus vídeos, não oiço a minha música. estar sempre a ouvir-me é cansativo e já sei de cor as minhas histórias. não gosto desse lado narcisista da arte. gosto de a fazer, não de a ver constantemente.

no texto onde apresenta o disco, escreveu que é sobre amor. mas as suas personagens nunca são felizes…

o amor não tem necessariamente de ser uma coisa romântica, mas também não sei explicar por que nunca dou um final feliz às minhas histórias. apesar de não ser uma pessoa triste, atrai-me escrever sobre o triste. atrai-me tentar ver a solidão ou a perda como uma coisa bonita.

é uma contradição, uma vez que é uma pessoa colorida?

se calhar também é por causa disso, para equilibrar um bocadinho. tenho dificuldade em escrever coisas muito alegres porque a felicidade parece demasiado banal. é algo que tenho de trabalhar. não ter esse preconceito de que a felicidade é, necessariamente, uma coisa superficial.

e a capa também é sombria.

mas depois tem uma flor que dá cor àquilo tudo. escolhi essa capa porque dá para perceber aquilo que acho do disco: mais melancólico, nostálgico e introspectivo do que o primeiro.

há um tema em espanhol. é o lado calculista do negócio a falar mais alto para entrar no mercado espanhol?

eu nem queria meter esta canção no disco, o meu manager é que a adora e insistiu. escrevi essa canção para a digressão que fizemos em espanha e funcionou tão bem que também comecei a cantá-la cá. mas não queria gravar, até para não parecer aquela cantora armada em poliglota, a mostrar as línguas todas que fala.

mas tem feito uma carreira internacional ‘simpática’. além de espanha, já tocou em inglaterra, alemanha, córsega, marrocos, escócia, suíça. guarda momentos especiais?

tem corrido sempre muito bem, mas marrocos foi o melhor público que já tivemos. ia cheia de medo porque já tinha ido a marrocos muitas vezes, é um dos meus países preferidos, mas dessa vez senti um machismo que desconhecia. íamos a restaurantes e os homens desprezavam-me completamente. fiquei um pouco preocupada, a pensar ‘se isto é assim, o concerto vai ser um desastre’. mas foi incrível. o público estava histérico, sai e eles continuavam a cantar a canção para voltar. e a quantidade de marroquinos que me adicionou no facebook no dia seguinte foi incrível.

iniciou 2013 com uma participação no programa de jools holand. como aconteceu?

a editora inglesa enviou o primeiro disco, eles gostaram, vieram a portugal ver um concerto e, no fim, disseram-me que queriam marcar uma data. mas depois passaram-se meses e não acontecia nada…

ficou ansiosa à espera de resposta?

não. aprendi com o tempo a não criar falsas expectativas. neste meio acontece muito vezes dizerem-nos que sim e depois as coisas não acontecerem. por isso só festejo quando as coisas se concretizam. se não criar essa defesa vou ficar desiludida muitas vezes. com o jamie cullum foi assim. convidei-o para este álbum, ele aceitou, mas só festejei quando o tema ficou gravado.

já recebeu muitas negas?

quando vivi em nova iorque levei uma demo a 40 restaurantes, para ir lá tocar enquanto as pessoas jantavam, e só um é que me respondeu. faz parte, mas não deixo de fazer nada por causa disso. além do jamie, convidei outra pessoa (que não vou dizer quem porque pode ser que no futuro a coisa se dê) que me deu uma nega e não me faz confusão nenhuma. sou uma pessoa bastante segura e alguém dizer-me que não quer entrar no meu disco não faz com que ache que a música não é boa. faz com que ache apenas que aquela pessoa não gosta ou, neste momento, não está interessada.

alexandra.ho@sol.pt