The xx: Um caso sério de amor

O primeiro Night + Day, minifestival criado pelos The xx, encheu os Jardins da Torre de Belém, em Lisboa, de público e muito boa música e revelou a atracção mútua entre fãs e banda. Só faltou o ambiente diferente do recinto e o cuidado especial na oferta culinária prometidos pelo trio londrino.

a primeira vez que oliver sim, voz e baixo dos the xx, se dirigiu ao público foi para consumar um facto há muito conhecido. “planeámos isto durante um ano… parece um casamento”. e foi isso mesmo que aconteceu na noite de domingo nos jardins da torre de belém, em lisboa: o longo noivado entre o trio londrino e o público português – esta foi a quarta vez que se apresentaram no nosso país, depois dos concertos na aula magna e alive, em 2010, e primavera sound, no ano passado – transformou-se oficialmente em matrimónio.

as imagens do night + day

essa sensação de comunhão sentiu-se logo ao início da tarde, quando as portas do recinto abriram e centenas de fãs encavalitaram-se imediatamente junto ao merchandising do trio londrino. em poucas horas, os presentes nos jardins da torre de belém, que acolheram o primeiro night + day de três datas (seguem-se berlim e londres), estavam trajados a rigor e para onde quer que se olhasse via-se sempre alguém com uma t-shirt com um enorme x estampado.

deambulando pelo recinto, a única decepção foi a ausência do ambiente diferente e especial (no espaço e na oferta de bebidas e comida) que a banda tinha prometido criar. em março, quando vieram a lisboa apresentar o cartaz do night + day, oliver sim disse ao sol que queria “algo mais honesto do que hambúrgueres e pizza”, mas essa foi exactamente a oferta que acabou por existir em belém. a única promessa cumprida foi a ausência da habitual ‘poluição visual’ que se vê nos festivais de música. mas no que toca à música, os the xx acabaram a noite com missão cumprida.

fazendo justiça ao conceito do festival – três fãs de música a organizar um evento com os artistas todos à sua escolha –, oliver sim, romy madley croft e jamie smith assistiram a todos os concertos do palco principal, ora numa das laterais, ora no relvado, junto dos fãs lisboetas que, inevitavelmente, se aproximavam para pedir autógrafos e fotografias. apesar do segurança encorpado que os acompanhava, foram muitos os que conseguiram chegar à fala com os músicos, mesmo depois de oliver sim pedir para não ser incomodado durante a actuação dos mount kimbie, banda de londres de quem se diz sentir próximo e a cujo concerto assistiu concentradíssimo.

antes dos mount kimbie, o aquecimento para o concerto mais esperado da noite, naturalmente o dos the xx, começou com os portugueses paus, com a sua habitual competência e potência sonora a garantir aplausos efusivos. mas o primeiro vencedor de night + day foi o espanhol john talabot, que surgiu acompanhado por pional. os dois, nos teclados e percussão electrónica, cativaram o público com os temas dançáveis e atmosféricos do excelente álbum fin. e a primeira surpresa do dia aconteceu quando oliver e romy apareceram em palco para, em conjunto, interpretarem ‘chained’.

a seguir aos the xx, os chromatics reuniam as maiores expectativas do dia. com uma actuação competente, os norte-americanos não conseguem, contudo, transpor para palco a voluptuosidade que a sua música tão bem carrega em disco e a monotonia acaba por se instalar. algo que acontecia, há uns anos, aos anfitriões da noite, mas que o trio conseguiu superar à medida que foi acumulando experiência na estrada. quem viu os the xx em 2010 na aula magna não reconheceu, certamente, a banda que no domingo actuou em belém. e, na realidade, só há uma grande diferença: a confiança e o à vontade que agora exibem.

inevitavelmente de negro, assim que oliver, romy e jamie entraram em palco foram brindados com uma chuva de aplausos, manifestação de carinho que se prolongou durante todo o concerto. sem grandes artefactos cénicos, a presença contida do trio emoldura na perfeição a música, também ela, minimal e descarnada. a atenção continua a recair sempre nos jogos vocais entre romy e oliver, entre a voz aveludada dela e a grave dele. mas se há um ano, no primavera sound, no porto, já se sentia que jamie tinha um papel cada vez mais determinante, em belém percebeu-se que ele é o verdadeiro maestro sonoro do trio, criando uma energia valiosa para a progressão do espectáculo.

com um alinhamento exímio, a banda visitou os hits do disco de estreia – ‘crystalised’, ‘vcr’, ‘heart skipped a beat’, ‘islands’ e ‘shelter’, este último apresentado com roupagem nova – e mostrou maior dinamismo rítmico nos temas do mais recente coexist, como ‘reunion’, ‘sunset’ e ‘fiction’. às primeiras notas de cada tema, o público respondia com palmas e gritos sonoros, mas a grande ovação da noite aconteceu já no encore, depois do instrumental ‘intro’. “lisboa é uma das nossas cidades preferidas na europa. é uma sorte começar o night + day aqui”, disse oliver, perante o delírio geral. antes, no sábado e durante todo o dia de ontem, os the xx já tinham demonstrado a devoção pela cidade no facebook e instagram, ao partilharem dezenas de imagens da capital com a referência: “lisbon is so beautiful [lisboa é tão bonita]”.

hoje, enquanto o recinto estava a ser desmontado, a banda partilhou mais algumas fotos de lisboa no instagram, mostrando a sua afeição pela cidade. “lisbon you were the most incredible crowd [lisboa, vocês são a plateia mais incrível]”, podia ler-se na legenda de uma imagem. e a retribuição dos fãs portugueses também foi mostrada pelo trio, através da fotografia de um painel deixado no recinto. “it’s not a fiction! your music and lisbon are chained, so reconsider: make us your shelter for infinity”. é um caso sério de amor, este.

oliver sim dos the xx: ‘somos obcecados por controlar’

alexandra.ho@sol.pt