fala-se em milhões e poucos são os que têm uma noção do que está em causa. fala-se em desemprego, mas é difícil imaginar o quanto estão a sofrer milhares de famílias. os números têm essa desvantagem. não dão uma imagem da vida real. percebe-se que são elevados, mas não há uma figura que lhes esteja associada.
sabe-se sim que as vidas mudaram por causa deles. um exemplo bem concreto é dado pela ginástica que as famílias são obrigadas a fazer para conseguirem sobreviver. os supermercados são um bom barómetro disso. antes de a crise rebentar em força, eram frequentados da parte da manhã por pessoas com uma certa idade que procuravam as pechinchas do dia. hoje quase todas as famílias têm vários cartões das diferentes marcas que lhes permitem usufruir dos descontos do dia. se a carne está em promoção no pingo doce é lá que se vão abastecer. se os iogurtes e outros lacticínios estão mais baratos no jumbo, já se sabe que quem tem filhos vai lá fazer as compras. o mesmo se passará com os produtos em baixa do continente e afins. com os combustíveis a história é idêntica. as pessoas procuram por todos os meios poupar onde podem.
a crise acaba assim por mudar os comportamentos. quem é que hoje vai a um restaurante e não se sente mal em deixar o prato com metade da comida? o que antes era normal, hoje passou a ser um atentado a quem não pode. e foi com este sentimento de ‘injustiça’ do desperdício que se criou um movimento que procura ajudar aqueles que não têm, com a comida que sobrava nos restaurantes – não nos pratos, como é evidente. mas este facto vem pôr a nu o quanto a europa estava doente. fruta com dimensões que não cumpriam o determinado por bruxelas acabava no lixo. legumes com uma cor esverdeada, a mesma coisa. foram, sem dúvida, os burocratas de bruxelas que criaram uma filosofia do desperdício que não podia acabar bem. o problema é que construíram um mundo do faz de conta que agora também está a sofrer com as consequências. quantas profissões não surgiram à boleia dessas bizarrias? quanto não se gastou a investir em máquinas cuja finalidade era absurda? os excessos nunca acabam bem…
vitor.rainho@sol.pt