é um número “assaz irrelevante” no que à matemática diz respeito. assim o escreve alex bellos no livro alex no país dos números. mas desde as civilizações antigas que o sete exerce fascínio. na natureza, observa-se o arco-íris, fenómeno meteorológico e óptico que nos mostra sete cores e que em todas as culturas ganhou dimensões mitológicas (nem sempre positivas). os sete astros conhecidos até então deram origem à divisão do calendário em semanas de sete dias para os babilónios e os sumérios. lua, sol, marte, mercúrio, júpiter, vénus e saturno têm correspondência, em várias línguas, aos dias da semana. o dia da lua, por exemplo, é lundi (francês), lunes (espanhol), monday (inglês), montag (alemão)… a língua portuguesa é uma excepção, mas vai buscar duas referências religiosas para os dias do fim-de-semana: sábado vem do hebreu shabat (descanso) e domingo procede do latim dominus (senhor). à homenagem aos astros errantes, que os antigos criam ser deuses, junta-se o facto de cada uma das fases lunares durar cerca de sete dias.
a propósito de calendários, no gregoriano setembro é o nono mês do ano, mas fazia jus ao nome no calendário romano e era o sétimo mês. e quem nunca sabe em que data calha a páscoa, basta-lhe somar sete domingos a partir do carnaval.
na tradição hindu, são sete os chakras, ou centros de energia vital, que o corpo humano tem. no antigo egipto, num papiro datado de 1650 a.c., que era por sua vez uma cópia de um documento mais antigo, o escriba ahmes reproduz dezenas de problemas matemáticos. num deles, sobre progressão geométrica, pergunta-se: há sete casas, em cada casa há sete gatos, cada gato comeu sete ratos, cada rato comeu sete grãos de espelta, se semeado, cada grão teria produzido sete heqat (uma unidade egípcia de volume) de espelta. quantos elementos há no total? a resposta é 19.607 (7 + 7 2 + 7 3 + 7 4 + 7 5 ou sete casas + 49 gatos + 343 ratos + 2.401 grãos + 16.807 heqats).
os britânicos têm uma lenga-lenga com o mesmo princípio, mas cuja ambiguidade permite várias respostas (“a caminho de st. ives/encontrei um homem com sete mulheres/cada mulher tinha sete sacas/cada saca tinha sete gatas/cada gata tinha sete gatinhos./gatinhos, gatas, sacas, mulheres/quantos iam para st. ives?”). por cá, menos dados às brincadeiras matemáticas, temos a música ‘lá vai uma, lá vão duas’, na qual se canta ‘sete e sete são catorze, com mais sete são vinte e um, tenho sete namorados, e não gosto de nenhum”.
da grécia recebemos a lenda da hidra de lerna, um monstro que tinha sete cabeças de serpente (nalgumas versões, noutras tinha mais), e também de os sete contra tebas, transformada por ésquilo numa tragédia (das 80 peças que escreveu só sete sobreviveram). aqui se conta a história da expedição de sete chefes que tentam invadir tebas, mas cada um dos sete portões é defendido por um herói da cidade. os gregos listaram os seus sete sábios – a saber, tales de mileto, bias de priene, pítaco de mitilene, sólon, cleóbulo e quílon –, embora em o banquete dos sete sábios, ficção de plutarco, um dos sapientes seja um tirano, periandro.
três séculos antes, os helénicos fizeram a primeira lista de maravilhas. eram sete, segundo o poeta antípatro e philon de bizâncio: os jardins suspensos da babilónia (actual iraque), as pirâmides de gizé no egipto, a estátua de zeus, ou júpiter, em olímpia (grécia), o colosso de rodes (grécia), as muralhas da babilónia, o templo de diana, ou ártemis, em éfeso (turquia) e a tumba de mausolo em halicarnasso (turquia); mais tarde, as muralhas da babilónia foram substituídas pelo farol de alexandria. das sete vistas maravilhosas, só sobreviveram as pirâmides: uma lenda rezava que tinham sido mandadas construir por josé, filho de jacó, para nelas conservar os cereais que recebeu dos egípcios durante os sete anos de abundância para enfrentar sete anos de escassez (é baseada no antigo testamento, que não faz referência às pirâmides).
no dia 7/7/2007 o estádio da luz acolheu a cerimónia da escolha popular das sete novas maravilhas: taj mahal (índia), grande muralha (china), cristo redentor (brasil), machu picchu (peru), coliseu (itália), ruínas de petra (jordânia) e chichén itzá (méxico). na mesma ocasião foram dadas a conhecer as sete maravilhas de portugal.
a religião é fonte para várias referências ao número sete. a expressão “sétimo céu” conduz-nos aos sete céus a que judaísmo, cristianismo, islamismo e hinduísmo fazem referência.
para os católicos, os pecados capitais eram oito, mas o papa gregório i, no século vi, reduziu e modificou as classificações que outros religiosos enumeravam para vaidade, avareza, ira, preguiça, inveja, gula e luxúria. no século xiii, s. tomás de aquino ainda propôs uma outra lista, mas a escolha do papa acabou por prevalecer, graças também ao facto de dante a ter seguido na divina comédia.
aos sete pecados capitais contrapõem-se as sete virtudes (humildade, generosidade, paciência, diligência, caridade, temperança e castidade). as sete-virtudes é nome também dado à cachaça no brasil. a igreja católica segue os sete sacramentos: baptismo, confirmação ou crisma, eucaristia, penitência, unção, ordens (sacerdócio), matrimónio. e há quem, como os açorianos, festeje os sete dons do espírito santo. em observância ao sábado como dia sagrado, nasceu no século xix o culto protestante igreja adventista do sétimo dia.
nas escrituras, o algarismo ganha uma simbologia própria. significa totalidade, universalidade, perfeição. “abençoou deus o sétimo dia e o santificou, porque nele descansou de toda a obra que realizara na criação”, lê-se no génesis. no êxodo, é descrito o candelabro de sete braços com sete lâmpadas (menorá), que é hoje o símbolo do estado de israel. crê-se que a menorá simbolize a semana e os dias da criação. no novo testamento, existe um grupo de sete escritos, de pedro, tiago, joão e judas, conhecido como cartas católicas. o sete é o número simbólico por excelência no livro do apocalipse. o apóstolo joão descreve a sua visão de jesus cristo, com sete estrelas na mão direita e sete candelabros de ouro à sua volta. as sete estrelas são os anjos das sete igrejas e os sete candelabros são as sete igrejas (às quais se dirige). mais à frente, descreve o trono do céu, que tem à sua frente “sete lâmpadas de fogo, que são os sete espíritos de deus”. são ainda sete os selos que o cordeiro de sete chifres e sete olhos abre. ao sétimo selo, sete anjos tocam sete trombetas e depois jorram sete taças da ira de deus.
ingmar bergman adaptou a sua peça de teatro o sétimo selo para o cinema – a 7.ª arte, segundo o italiano ricciotto canudo; o alemão hegel listara seis, música, pintura, escultura, arquitectura, poesia e dança. outro filme inspirado no mesmo tema é a sétima profecia, com demi moore. à volta dos pecados mortais, há o filme se7en – sete pecados mortais, grande sucesso de david fincher com brad pitt e morgan freeman. outros filmes famosos são o japonês os sete samurais (de akira kurosawa) e os norte-americanos os sete magníficos (de john sturges) e sete noivas para sete irmãos (de stanley donen).
outra das sete artes, a música, também tem uma estreita ligação ao sete, ou não fosse esse o número de notas musicais. foi o italiano guido d’arezzo, no século x, o autor do moderno sistema de notação musical. os nomes das notas (excepto o dó, que era originalmente ut) são retirados da primeira sílaba de cada verso do ‘hino a são joão batista’. na música clássica, existem várias sétimas sinfonias importantes, como as de dvorák e beethoven, por exemplo, mas a que está intimamente ligada ao sete é a sétima sinfonia de krzysztof penderecki, cujo subtítulo é sete portas de jerusalém (que na verdade são oito, sendo que a oitava, a porta da misericórdia ou de ouro, está fechada há séculos, à espera do regresso do messias). a obra do compositor polaco, uma homenagem aos três milénios da cidade que é o centro espiritual do judaísmo, cristianismo e islamismo, tem sete movimentos.
na música pop, um dos discos marcantes no início dos anos 90 é seven, dos ingleses james. na década anterior nasceu a sétima legião, grupo português cujo nome remete para a coluna militar romana que se estabeleceu em chaves. um dos maiores sucessos do grupo fundado por rodrigo leão chamava-se ‘sete mares’. esta é uma expressão que aparece pela primeira vez nas aventuras de simbad nas mil e uma noites. mediterrâneo, adriático, negro, vermelho, cáspio, arábico e golfo pérsico eram os conhecidos de então, mas “navegar os sete mares” é uma expressão que aponta mais para a imensidão do que para um número certo. aliás, o número de mares é tema de discussão ainda hoje, sendo mais de cem.
no meio do oceano atlântico, na ilha de são miguel, a lagoa das sete cidades oferece uma paisagem deslumbrante e o seu nome radica da lenda da ilha das sete cidades, que ainda no século xv era representada nos mapas. no atlântico sul, e sem qualquer pozinho de lenda, está o arquipélago tristão da cunha, que ficou com o nome do comandante português. a capital destas ilhas remotas é edimburgo dos sete mares. para o mar, mas não para tão longe vão os pescadores da nazaré. as suas mulheres vestem sete saias. a contagem de sete em sete ondas do mar alteroso será uma das explicações para essa tradição.
jerusalém, constantinopla (hoje, istambul) e roma são cidades fundadas em sete colinas. reza o mito que lisboa também, mas esta ideia feita não assenta tanto em factos (às colinas de são jorge, são vicente, sant’ana, santo andré, santa catarina, são roque e chagas falta a graça) e mais numa comparação com roma. aliás, não somos os únicos. por todo o mundo, de cáceres a melbourne, de atenas a teerão, de seattle a macau, dezenas de cidades reclamam estar assentes em sete colinas.
se alguém percorrer estas cidades pode afirmar que é um “português das sete partidas”, como o fez o infante d. pedro entre 1418 e 1428. as sete partidas do mundo é o nome também de um romance de fernando namora, ao passo que manuel alegre se decidiu por titular sete partidas ao livro em que evoca o viajante, irmão do infante d. henrique. as sete partidas é também o nome do corpo jurídico mais importante de castela, tendo sido escrito no século xiii.
um clássico da literatura mundial é os sete pilares da sabedoria, de t.e. lawrence, o famoso lawrence da arábia, que narra a revolta árabe contra a dominação turca. para “os jovens dos 7 aos 77 anos”, o jornal do tintin publicou as sete bolas de cristal, uma história inspirada na maldição do faraó. só mesmo para os mais novos, a inglesa enid blyton criou a série juvenil os sete, na qual se resolvem mistérios, um pouco à imagem de os cinco, também da sua autoria. mais recentemente, outra inglesa, j.k. rowling, escreveu a saga de fantasia harry potter em sete livros. para os mais novos, há a branca de neve e os sete anões, mas também o pequeno polegar, que era um de sete irmãos.
na política (ou na ausência dela), o sete também tem assento. a guerra dos sete anos (1756-1763), que envolveu portugal, há quem a considere a primeira guerra mundial, por ter decorrido para lá da europa. em frança, a república instituiu em 1873 períodos de sete anos de presidência – o septenato, em vigor até 2000, quando jacques chirac levou a referendo o encurtamento para cinco anos, que foi apoiado pelos franceses. sete anos foi também o tempo que o general golpista juan velasco esteve no poder no peru.
terminemos de forma desportiva, com a certeza de que muito ficou por contar. no atletismo, a competição de sete provas é o heptatlo, que nos jogos olímpicos é reservado às mulheres (o decatlo é para os homens). a prova masculina é só em pista coberta.