Democracia à tailandesa

Reformar, depois eleger – defende a oposição. Eleger, depois reformar, responde o partido da maioria. Na discórdia sobre o que é prioritário reside o pretexto para a luta pelo poder na Tailândia, que se arrasta desde Novembro. E nem as eleições de dia 2 conseguiram que o país asiático, fracturado entre duas forças políticas, fizesse…

O Partido Democrático – cuja base de apoio reside na classe alta e média-alta de Banguecoque e no Sul do país – boicotou a votação e impediu o acesso às urnas. Em 10% dos círculos eleitorais não foi possível votar. E eleições parciais já têm nova data: 23 de Fevereiro.

Ainda sem resultados oficiais, é esperada a vitória do Partido Pheu Thai, dominante nos meios rurais do Norte e Nordeste. A oposição reclama a anulação das eleições.

A participação ficou-se pelos 45,8%, muito aquém dos 75% que votaram em Julho de 2011. Mesmo nas regiões onde o voto foi tranquilo e o apoio ao partido do Governo é claro, a ida às urnas registou quebras: 51% no Norte e 55% no Nordeste, contra 77% e 72% da última votação.

Uma proposta de amnistia apresentada pelo Pheu Thai, partido do Governo, deu o mote para o início dos protestos: o perdão iria abranger Thaksin Shinawatra, primeiro-ministro deposto em 2006, condenado à revelia a dois anos de prisão por corrupção, exilado no Dubai – e irmão da primeira-ministra Yingluck Shinawatra.

Milhares de manifestantes acamparam nas principais artérias de Banguecoque. E se os protestos foram sobretudo pacíficos, também houve explosões de violência: mais de uma dezena de pessoas morreram e seis centenas foram feridas.

Yingluck não aceitou demitir-se, marcando eleições e mantendo-se como PM interina. A oposição não lhe reconhece legitimidade e acusa-a de ser uma marioneta do irmão. Mas o Partido Democrático também não está isento de críticas: segundo a organização dos direitos humanos Human Rights Watch, “isto nunca aconteceu na Tailândia, especialmente esta obstrução ao voto por parte de um movimento político que alega estar a lutar por mais reformas e democracia”.

Esquema do arroz

Suspeitas de corrupção que envolvem o Governo e Yingluck estão a ser investigadas pela Comissão Nacional Anticorrupção. Uma medida do Executivo que implica adquirir as colheitas de arroz a um valor 50% mais alto do que os preços mundiais pode ser, como acusa a oposição, uma maneira de comprar os votos de milhões de camponeses.

A investigação já levou a China a desistir da compra de 1,2 milhões de toneladas de arroz – e o Governo não tem dinheiro para pagar aos agricultores, cada vez mais insatisfeitos.

O Partido Democrático mantém a esperança que Yingluck seja destituída. Mas a própria oposição sofreu um revés esta semana: face ao estado de emergência decretado em Janeiro, um tribunal ordenou a detenção do líder do Partido Democrático e de outras 18 pessoas, acusadas de colaborar e apoiar acções que criaram situações de emergência.

ana.c.camara@sol.pt