Pêpê Rapazote: ‘Quem faz TV em Portugal está preparado para tudo’

O canal FOX Life já estreou a terceira temporada de Shameless – No Limite e Pêpê Rapazote participa em dois episódios. O actor conseguiu o papel há dois anos, quando viajou pela primeira vez até Los Angeles para um mês de castings. Desde então tem repetido anualmente a experiência e, ao telefone dos EUA, falou…

Está actualmente em Los Angeles por razões profissionais. O que foi aí fazer?

Tal como no ano passado, vim nesta altura para, como lhe chamam aqui, a ‘temporada piloto’. É a temporada em que as grandes cadeias televisivas fazem episódios-piloto para depois, em Maio, escolherem os projectos que irão ser produzidos. E eu estou aqui a escarafunchar. Para já sem nenhum trabalho em vista, mas a tentar muitas audições, que é o que se faz nesta altura do ano.

Foi assim que conseguiu a participação em dois episódios de Shameless – No Limite?

Foi um acaso feliz. Vim para Los Angeles pela primeira vez há dois anos, mas estive três a tentar arranjar um agente aqui, o que à distância é complicadíssimo. Quando consegui, tratei do visto de trabalho e depois de ter o carimbo no passaporte fiz o meu primeiro casting e fiquei. Foi um começo auspicioso, mas que tem andado mais morno ultimamente.

Faz de barão da droga brasileiro…

Sim, falo português e tudo, mas com sotaque. É um barão da droga brasileiro carioca, mas que anda com uns fatos todos bonitos em vez dos calções e havaianas o dia todo. Este é mais evoluído, vai até Chicago, tem negócios em Miami, etc… Mas é muito engraçado porque a história tem a ver com uns negócios de droga que correram mal ao Steve, a personagem de Justin Chatwin, o actor com quem mais contraceno, e ele ficou de se casar com a minha filha para ela poder obter um green card.

Como foi esta experiência?

É um mundo completamente diferente. É muita gente, muitos actores, muitos realizadores, muitos produtores, e aqui o facto de termos um agente com mais nome tem imenso peso. Quando vamos a um casting as pessoas perdem mais tempo connosco se o nosso agente for mais conhecido. É quase como um crivo de qualidade. Mas além disso há uma diferença enorme em termos de orçamentos e isso faz toda a diferença. Aqui grava-se um episódio em sete dias, em Portugal grava-se um num dia. São universos completamente distantes. Aqui é-nos permitido fazer um trabalho mais sério, mais completo. Gravar seis cenas numa semana dá um gozo enorme e permite, não só a nós como aos realizadores, perceber melhor as cenas e as personagens. É tudo muito mais perfeccionista. Por isso é que costumo dizer: quem faz televisão em Portugal está preparado para a guerra porque tem de fazer depressa e bem.

Em Portugal tem uma carreira reconhecida. O que o levou até aí?

Antes de ser actor também era arquitecto. Na realidade já fiz um bocadinho de tudo e a carreira de actor obviamente que me corre bem em Portugal, mas isto tem a ver com uma voracidade muito grande de ter desafios novos, algo que não acontece com muita facilidade em Portugal porque temos um mercado pequeno. Então achei que, falando várias línguas e tendo facilidade em integrar-me noutras culturas, era uma boa opção tentar os Estados Unidos. A ideia não é fazer uma carreira prolongada, mas sim tapar os buracos dos desafios novos que não surgem tão frequentemente em Portugal. Pode parecer um bocadinho acriançado, mas é um pouco ‘estou farto de brincar com este brinquedo, quero outro’.

Estar um mês nos EUA também obriga a um investimento pessoal e financeiro grande. Como gere isso?

É difícil e muito solitário, mas levo na desportiva. Quando era miúdo, o meu pai foi para a Venezuela abrir uma filial da Teixeira Duarte, em 1979. E nós, depois de ele estar lá um ou dois anos a ir e vir, acabámos por ir para lá viver dois anos. Se acontecer alguma coisa com mais continuidade que implique estar aqui uma temporada ou duas, se calhar ainda trago a família…

Esse lado aventureiro começou com essa experiência na Venezuela?

Não tenho dúvidas. Foi a melhor experiência da minha vida. Foram dois anos num admirável mundo novo. Foi isso que me deixou a provocação, o bichinho do emigrante, que é diferente do turista.

No final do mês regressa a Lisboa e volta às gravações de Bem-vindos a Beirais?

Sim, isto é uma espécie de licença sem vencimento. Quando regressar volto a Bem-Vindos a Beirais, uma série que acho muito interessante, com uma ingenuidade fantástica e um humor que nos faz lembrar o nosso cinema dos anos 1940. São personagens que todos conhecemos nas aldeias, que existem e que fazem parte do nosso imaginário. É um projecto para continuar, até porque as audiências assim o mandam.

alexandra.ho@sol.pt