Venezuela versus Ucrânia

Há não muitos anos defendia-se que a notícia mais insignificante que ocorria na nossa rua era mais importante que a morte de dezenas de pessoas no outro extremo do planeta. Num dos míticos filmes sobre o jornalismo, Os Homens do Presidente, que relata o escândalo Watergate, responsável pela queda do Presidente Nixon, ouve-se numa reunião…

Nos últimos tempos muito mudou no jornalismo e na vida das pessoas. O que se passa a milhares de quilómetros de distância passou a ser tão ou mais importante do que o que acontece na nossa ‘paróquia’. Daí o interesse de tantas pessoas pelo que se passa na Venezuela e na Ucrânia. Diga-se que essa curiosidade só existe porque nos chegam imagens dos confrontos. Podem ser parciais, mas temos alguma coisa para comentar. O mesmo não se passa na Coreia do Norte onde, supostamente, milhões de pessoas vivem em condições miseráveis ou na Arábia Saudita, onde as mulheres podem ser mortas por apedrejamento se forem consideradas adúlteras, mesmo que tenham sido violadas… Como não temos imagens que se refiram a esses dois factos, não existe a comoção mundial.

No que à Venezuela e à Ucrânia diz respeito, são muitos os que ditam sentenças definitivas como se vivessem nalgum dos dois países ou conhecessem a cultura local. Há, de facto, uma tentativa constante de olhar para outras realidades com os nossos olhos. O que é, inevitavelmente, um disparate.

Pelo que se percebe da Ucrânia, onde existem quatro centrais nucleares, uma marinha herdada da extinta União Soviética – nem todo o material estará obsoleto -, muito dificilmente a Rússia deixará que o Ocidente ‘conquiste’ o país para a sua causa. Seria o mesmo que o Canadá ou o México derivassem para um governo comunista e os americanos o aceitassem de bom grado. É dos livros.

Calculo que os manifestantes ucranianos e venezuelanos terão muitas razões de queixa dos seus governos. Não sei se as oposições serão melhores ou piores. O que sei é que os destinos da Ucrânia e da Venezuela devem ser determinados pelos seus povos.

vitor.rainho@sol.pt