Esta semana, o primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho, afirmou no Parlamento que “está a chegar o momento em que temos realmente de mostrar a nossa capacidade de prosseguir sem condicionamento”. Durão Barroso, presidente da Comissão Europeia e um dos três credores externos da troika, admitiu que uma saída sem cautelar “será o melhor para todos”. Uma frase, aliás, proferida um mês após Barroso ter dito que um cautelar seria a melhor opção para Lisboa.
Na segunda-feira, também Steffen Kamppeter, secretário de Estado Parlamentar do Ministério das Finanças alemão, adiantou que Lisboa tem uma “boa oportunidade” para uma saída limpa, uma decisão que deriva da “vontade política”. A esta opção não é alheio o facto de os partidos anti-europeus terem entre 10% e 20% das intenções de voto nas próximas eleições europeias na Alemanha, na Finlândia e na França.
Porém, a vontade política de Lisboa e de Bruxelas de ter mais um sucesso na Zona Euro após a Irlanda é um risco que poderá sair caro a Portugal. O BCE defende um cautelar – o FMI mantém-se omisso na opção – e surgiu um aviso do instituto Bruegel, o mais influente think tank de Bruxelas, presidido pelo ex-governador do BCE, Jean-Claude Trichet.
Sucesso vs prudência
“Todos estão tentados a pedir uma saída limpa para reclamar um sucesso político, mas as contínuas fragilidades estruturais da economia portuguesa pedem a escolha de um cautelar que assegure que as reformas estruturais se mantêm”, considera a organização, num relatório sobre a saída dos programas da troika. Uma saída limpa não é “aconselhável” e um programa cautelar seria “a escolha racional”, acrescenta a instituição.
As vantagens são várias: uma linha de crédito de Bruxelas garante uma saída mais “robusta e sustentável”, ao mesmo tempo que assegura que o andamento das reformas se mantém através de uma vigilância reforçada.
O racional desta opção deriva ainda das “enormes” necessidades de financiamento que Portugal enfrenta no futuro – um total de 70 mil milhões de euros entre 2014 e 2017, segundo dados do IGCP, o instituto que gere a dívida pública portuguesa.
Depois de ter recebido um alargamento do prazo dos empréstimos do fundo de resgate europeu de 15 para 22 anos, Portugal tem ainda margem para pedir uma nova extensão e aliviar o peso dos financiamentos, adianta o think tank. A Grécia, por exemplo, tem prazos até 30 anos acordados com a UE.
Seguir as pisadas da Irlanda é um risco: Portugal tem “taxas de juros mais elevadas, previsões de crescimento futuro mais fracas e menos capacidade para gerar défices primários positivos de uma forma constante” em comparação com Dublin.
Divergência com a UE
“Uma saída limpa só seria uma opção se o programa inicial da troika tivesse sido cumprido, o que não foi, de longe, o caso”, adianta ao SOL António Carlos dos Santos, ex-secretário de Estado dos Assuntos Fiscais. “Houve demasiados sacrifícios para tão parcos resultados. Como se perfilam novas exigências como o Tratado Orçamental, haverá sempre um programa cautelar, seja com esse nome ou outro”, acrescenta.
Apesar da descida dos juros desde o início do ano, a realidade é que os mercados estão a premiar os países periféricos como um todo e não um caso em particular. Os juros da dívida portuguesa atingiram esta semana 4,7%, o valor mais baixo desde 2010, mas sucedeu o mesmo na Grécia (6,8%) e na Irlanda (3,05%), esta última em mínimos de 2006.
O crescimento anémico é outra fragilidade de Portugal, já que a expansão do PIB é uma condição necessária para recuperar o emprego, ter capacidade para reduzir défices do Estado e pagar de forma sustentada a dívida pública. “A economia portuguesa vai continuar frágil e vulnerável a choques ainda durante algum tempo”, adianta o relatório do Bruegel.
Segundo as previsões do FMI (ver gráfico), Portugal deverá ter um crescimento médio de 1,8% anual em 2018. Será um desempenho inédito em 12 anos de moeda única e uma marca ligeiramente acima dos 1,6% da média da Zona Euro. O país encurtará um pouco a distância face à Europa, depois de uma década de divergência com a UE, mas ficará ainda muito longe dos seus companheiros de resgate, Grécia e Irlanda. A economia grega deverá expandir acima de 3,5% e a Irlanda acima de 2,5%, estando em melhor posição para reduzir a elevada dívida, que é superior a 120% nos três países.
“Nas condições actuais a dívida é impagável, o que mais tarde ou mais cedo, para que o país subsista, exigirá uma reestruturação”, adianta António Carlos dos Santos, também antigo director do núcleo de Economia e Finanças da Representação Permanente de Portugal em Bruxelas. “Com ou sem cautelar, os problemas do país vão permanecer”, conclui.