A vergonha das escutas ocultas

Durante largos meses, discutiu-se se as escutas tinham algum interesse ou não. Afinal, as conversas telefónicas só foram gravadas porque as personagens envolvidas diziam alguma coisa que tinha interesse para o processo em questão ou mesmo para outros casos. Penso que em momento algum se gravaram questões da vida pessoal dos intervenientes, até porque a…

De um lado estavam, portanto, os responsáveis do processo que investigavam uma vasta teia de interesses, tão comum em Portugal, e, do outro, os advogados de defesa dos hipotéticos arguidos, além, pasme-se, do procurador-geral da República (PGR) e do presidente do Supremo Tribunal de Justiça (STJ). Se para uns as escutas eram determinantes como prova do processo, para outros não tinham qualquer interesse e tudo não passaria de uma anedota.

Manda quem pode, e as escutas foram destruídas por ordem de Noronha Nascimento, presidente do STJ, apesar da oposição dos magistrados que conduziam o processo e de um dos arguidos.

O caso começava a ganhar contornos de Face Oculta, precisamente o nome dado à operação. Assim que o julgamento começou, o advogado desse arguido (Paulo Penedos) pediu logo autorização para aceder a algumas dessas escutas que entretanto se soube terem escapado à destruição, pois continham elementos fundamentais para a defesa do caso. Previsível.

Como também era suposto, os advogados de Armando Vara solicitaram, igualmente, o acesso às escutas destruídas, pois tinham elementos fundamentais para provar a inocência do antigo ministro de José Sócrates. Os mesmos causídicos que antes nada fizeram para que as escutas não fossem destruídas…

Com este trunfo, alguns dos arguidos, supostamente, serão absolvidos, até porque a sua defesa estava nas conversas em que o primeiro-ministro de então aparecia e que foram ‘queimadas’.

Por tudo isto, o Face Oculta é bem o rosto da Justiça portuguesa. Como é possível os magistrados encarregues do processo considerarem as escutas fundamentais e o PGR e o presidente do STJ entenderem o contrário? E já agora, se as escutas eram tão inócuas, porque não tê-las guardado para inocentar verdadeiramente os arguidos injustiçados? Mistérios…

vitor.rainho@sol.pt