“Não houve uma pré-preparação do Ministério da Saúde para esta lei e, do ponto de vista técnico e mesmo orgânico, teve que se perceber qual a melhor solução para os utentes e sistema. Do ponto de vista informático foi um desafio”, afirma ao SOL o Presidente dos Serviços Partilhados do Ministério da Saúde, Henrique Martins, que desenvolveu o sistema informático que suporta o Registo Nacional do Testamento Vital (Rentev). Dada a complexidade do sistema, salvaguarda que “ vão fazer tudo” para que não haja atrasos na disponibilização da ferramenta a 1 de Julho.
A portaria foi publicada esta segunda-feira, em Diário da República, e é obrigatório que a inscrição no Rentev seja feita através da Plataforma de Dados da Saúde (PDS), uma plataforma Web que disponibiliza um sistema central de registo e partilha de informação clínica. Neste momento, existem 578 instituições do Serviço Nacional de Saúde com acesso a esta plataforma.
O objectivo é que se possa aceder ao testamento vital através de qualquer ponto do país com Internet. Contudo, Henrique Martins admite alguns problemas devido ao acesso ainda limitado à Internet em alguns locais e também à “iliteracia digital”. Para já apenas um milhão de pessoas já beneficiou da PDS, que agora vai englobar também o Rentev. A a meta no final deste ano é duplicar esse número. “Tem que haver um maior envolvimento da sociedade civil, nomeadamente das Câmaras Municipais, Paróquias e Associações de Doentes”, pede o responsável do projecto.
Protecção de dados
Só os médicos e o próprio utente poderão ter acesso ao testamento vital. “Para já o acesso está condicionado a médicos, o que não quer dizer que depois não se possa alargar a enfermeiros, por exemplo. E o doente poderá saber exactamente quem é que acedeu aos seus dados através da plataforma”, explica Henrique Martins.
O testamento vital é válido por cinco anos. Com este documento os doentes vão poder, por exemplo, recusar transfusões de sangue e ser alimentados artificialmente quando tal adie o processo de morte. Vão também poder recusar o suporte artificial de vida, como ventilação e reanimação, e tratamentos experimentais. Caso o médico discorde do testamento vital do doente, poderá pedir uma substituição.
Se o utente mudar de opinião, prevalecerá a palavra do momento. “Nunca nada é preto no branco e há situações muito complexas. Em geral o doente escreve no testamento que não quer determinados cuidados, se mudar de ideias opta por algo que os médicos, à partida, já iriam fazer. O Hospital poderá, por exemplo, optar por documentar essa mudança de vontade por escrito mas isso já é algo caso a caso, o que nós oferecemos é uma solução tecnológica”, refere Henrique Martins.
Como se faz a inscrição
Haverá um modelo de “directiva antecipada de vontade e ou procuração de cuidados de saúde” com perguntas tipo, mas os utentes não vão estar obrigados a segui-lo. Caso o utente queira fazer um modelo próprio, então terá que ser reconhecido por um notário ou feito presencialmente. A regulamentação deste modelo específico que pede a identificação da pessoa e dá exemplos de doenças e de tratamentos a receber ainda está, contudo, por sair em Diário da República.
A inscrição no Rentev deve ser feita através do preenchimento desse formulário, nos Agrupamentos dos Centros de Saúde ou digitalmente através dos sites das Administrações Regionais de Saúde, no Portal do Utente ou no Portal da Saúde. Para fazer face a fraudes, Henrique Martins afirma que há mecanismos de segurança: “O registo e upload do documento em papel é feito por um funcionário e validado por um segundo.”
Antes já era possível fazer um testamento vital mas teria sempre que ser reconhecido por um notário, com os custos que isso acarretava. Além disso, os dados não estavam disponíveis online em qualquer zona do país. Agora, o Rentev assegura a actualização da informação e que qualquer médico, através da plataforma apropriada, possa consultar online esse testamento. Henrique Martins espera que entre 5 mil e 20 mil testamentos possam ser feitos até ao final do ano.