Convulsão na Câmara do Funchal

Ainda não passaram sete meses e já há brechas na coligação de seis partidos (PS, BE, PND, MPT, PTP e PAN) que, com 39,22% dos votos, ganhou ao PSD a Câmara do Funchal nas últimas eleições autárquicas.

O presidente da Câmara, Paulo Cafôfo, retirou todos os poderes executivos ao vereador Gil Canha (PND) e justificou-o com a necessidade de ter uma autarquia “facilitadora”. O edil também retirou poderes à vice-presidente, Filipa Jardim Fernandes (PS), mais concretamente, o departamento administrativo. Os editais com os despachos foram hoje publicados.

Gil Canha deixa de ser vereador a tempo inteiro mas não se demite. Quer marcar presença nas reuniões semanais para verificar até que ponto este “governo presidencialista” da Câmara aguenta.

Contactado pelo SOL, Gil Canha disse que, assim, “a Câmara não se manterá”. Mesmo depois do único vereador do CDS, José Manuel Rodrigues ter assegurado a governabilidade do município, embora não aceite pelouros executivos.

A autarquia fica agora ainda mais vulnerável. O Funchal tem 11 vereadores, 6 são da oposição (4 PSD, 1 CDS e 1 CDU). Se a correlação de forças já aconselhava a acordos pontuais, com o desavindo vereador Gil Canha o Executivo torna-se ainda mais frágil.

“Não podemos ter uma Câmara bloqueada, uma Câmara que não seja facilitadora e promotora de oportunidades”, disse ontem Paulo Cafôfo, justificando a retirada de poderes executivos a Gil Canha. Ao chamar a si todos os poderes do vereador Gil Canha, embora haja delegação e subdelegação de competências, Paulo Cafôfo torna-se um ‘super’ presidente. Tal gestão “presidencialista” – tal como o define Gil Canha –pode tornar-se impraticável e paira no ar o fantasma de eleições antecipadas/intercalares.

Alberto João Jardim já recomendou aos 4 vereadores do PSD que não aceitem cargos executivos. “Devem fazer oposição e não devem assumir qualquer compromisso com estes ‘fiascos’ que mal começaram já se está ver no que dá”, disse.

Paulo Cafôfo admitiu que “é uma hipótese” que todos os poderes que avocou sejam em breve atribuídos a um vereador do CDS ou até da CDU. Mas estes partidos não estão para aí virados. Aliás, já o deram a conhecer no início do mandato.

Canha acusa pressões de grupos económicos

Gil Canha considera que Paulo Cafôfo está a ceder a pressões dos interesses económicos e em particular ao Grupo Sousa.

Recorde-se que, recentemente, dezenas de trabalhadores de um empreendimento turístico conotado com o Grupo Sousa – o Quinta do Lorde – manifestaram-se em frente à Câmara do Funchal pedindo responsabilidades a Gil Canha, subscritor de uma acção popular contra o resort.

O caso Gil Canha teve ainda dois outros episódios de desgaste do Executivo autárquico: o processo da não ‘contratação’ pela CMF, como assessor, do arquitecto Luís Vilhena, mandatário da coligação Mudança; e a avocação pelo presidente, ao vereador Gil Canha, do dossier respeitante à revisão do Plano Director Municipal do Funchal (PDM).

Sobre o PDM, Gil Canha revela que a mão invisível do Grupo Sousa também se move. Dá a entender que a ‘Norvia’, empresa que faz parte do consórcio constituído com a empresa ‘Quartenaire Portugal’ para rever o PDM do Funchal, tem interesses do grupo Sousa.

No lóbi do Grupo Sousa junto da CMF, Gil Canha coloca também a Associação Comercial e Industrial do Funchal (ACIF –Câmara de Comércio e Indústria), liderada por Cristina Pedra.

As razões de Cafôfo

Para afastar Gil Canha, a autarquia argumenta que, diariamente, entre uma a duas dezenas de munícipes pediam audiências a Paulo Cafôfo por causa dos pelouros de Gil Canha. Sobretudo comerciantes (Gil Canha disciplinou as esplanadas da cidade) e promotores imobiliários.

Nas reuniões públicas mensais (a última de cada mês) era também comum os munícipes terem como alvo Gil Canha. Numa presença inédita, a poderosa Tecnovia chegou a lá ir, assim como o promotor imobiliário e presidente do Nacional, Rui Alves.

Gil Canha tinha os pelouros dos mercados municipais, Fiscalização Municipal, Obras Públicas, Urbanismo e Planeamento Estratégico. No início da semana, Paulo Cafôfo ensaiou junto de Gil Canha a retirada, apenas, dos pelouros dos Mercados Municipais e Fiscalização Municipal, mas Canha recusou.

O pelouro dos mercados teve um episódio recente até agora não revelado. O PS ‘alugou’ o Mercado do Funchal para o seu jantar-comício do 25 de Abril, com a presença de Francisco Assis. Gil Canha fez questão de cobrar ao PS-M, à cabeça e não fraccionados, os 2.500 euros exigidos pela utilização do espaço, algo que não caiu bem aos socialistas.

Paulo Cafôfo deixa duas garantias: a de que “a cidade não está desgovernada” porque “a Câmara está a funcionar”; e a de que que tem “o apoio de toda a equipa para continuar o trabalho”.

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