António Ramalho: ‘Nunca senti que a intervenção política limitasse as decisões’

Vencedor dos Best Leader Awards na categoria de Gestão de Empresa Pública, António Ramalho, CEO da Estradas de Portugal, diz que a diferença entre gerir no privado e no público está no escrutínio das decisões.

António Ramalho: ‘Nunca senti que a intervenção política limitasse as decisões’

Como é o seu estilo de liderança?

As lideranças são mais definidas pelos liderados do que pelos liderantes. Com as especificidades de cada empresa e com as exigências de governação que se impõem, diria que a liderança evoluiu em dois ou três aspectos.

Por exemplo?

Tornou-se mais importante conseguir convocar as pessoas para um projecto. Também aumentou muito a capacidade de motivação e de controlo. As capacidades de decisão e de trabalho em equipa estão generalizadas e muito mais dispersas e democratizadas na empresa. É importante que assim o seja. Há muitas decisões tomadas em comités, em órgãos intermédios. E a função de um gestor de topo é garantir que essas decisões seguem uma linha estratégica, envolvendo todas as pessoas.

Em Portugal há bons líderes, a nível público e privado?

Não faço distinção entre gestão pública e privada. Mas há exemplos de líderes que tiveram sucesso em situações de dificuldades. António Champalimaud comprou um banco que era considerado o patinho feio da banca portuguesa e passados seis ou sete anos era líder. Na gestão pública, o Fernando Pinto, da TAP, é um dos casos.

Há diferenças entre liderar uma empresa pública e uma privada?

Há. Já geri empresas dos dois tipos. Esta é a terceira vez que estou no sector público. Comecei na administração do Banco Pinto e Sottomayor, ainda público, e fiz a privatização. Depois geri a CP e agora estou na Estradas de Portugal. Hoje, uma empresa já tem de ter preocupações com a sociedade, seja pública ou privada. Do lado público, há o reconhecimento de que as empresas não podem, com base no álibi de que estão em defesa do interesse colectivo, prejudicar a sua sustentabilidade na gestão. Não é possível olhar para uma empresa pública apenas como um sorvedouro de dinheiro dos contribuintes. Hoje, gere-se para satisfazer um conjunto de interesses: não só os dos accionistas, mas também os dos colaboradores e clientes.

E no privado?

As diferenças estão nos meios à disposição do gestor. Enquanto continuamos a ter um meio mais tutelado e menos responsabilizante na gestão pública, que a crise veio acentuar, na gestão privada estamos a responsabilizar mais o gestor pelas decisões que toma. É como, de um lado, ter uma justificação prévia para os actos que toma. E, no outro, ter uma justificação a posteriori. Tem de se caminhar lentamente para uma maior responsabilização a posteriori das decisões do gestor.

A questão política pesa nas decisões e no estilo de liderança?

Não. A importância da política nestas empresas é ao nível do escrutínio e não ao nível da decisão. Nunca encontrei limitações do ponto de vista da decisão, quer agora, quer quando estive nas outras empresas públicas. E já trabalhei com Governos diferentes. Nunca senti que a intervenção política fosse um instrumento de limitação das decisões.