A persistência do analfabetismo

Portugal é o país mais analfabeto da União Europeia: esta revelação feita pela Pordata (base de dados da Fundação Francisco Manuel dos Santos) põe o dedo no centro da ferida nacional: a impreparação. 

A esmagadora maioria (70,6%) dos trabalhadores por conta própria tem apenas o ensino básico; por mais que se multipliquem (e oh, como se têm multiplicado) as conferências sobre empreendedorismo e inovação, o país não conseguirá sair da cepa torta em que há séculos tropeça sem atacar este problema de saneamento básico: falta de formação.

A obsessão com os números é o biombo atrás do qual se esconde a realidade da falta de habilitações.

Não é possível melhorar consistentemente uma economia sem um sector privado concorrencial e dinâmico.

Os salários são baixos porque o trabalho é pouco especializado – e nenhum país europeu pode sobreviver através da produção indiferenciada.

No início do milénio, em particular entre 2005 e 2009, fez-se uma aposta firme na melhoria do ensino universitário. Os resultados são visíveis: possuímos a mais vasta e apetrechada geração universitária da História de Portugal – que infelizmente nos últimos anos tem vindo a tornar-se uma geração de exportação, porque no modelo de mercearia modesta que nos tem sido imposto não há lugar para pessoas com conhecimentos e capacidade de inovação.

Porém, o analfabetismo de fundo nunca chegou a ser vencido.

O país da ditadura, que subitamente tantos incensam como um país de continhas certas, organizava-se para que a pobreza fosse tão imutável e hereditária como a riqueza; entendia-se que quatro anos de escolaridade chegavam muito bem para o povo: só em 2008 o número de portugueses com estudos superiores suplantou o dos com escolarização zero.

Muitos portugueses se fizeram empresários com esses estudos rudimentares, sem dúvida por esforço e mérito. Mas esse tipo de empresário não tem capacidade de sobrevivência na Europa contemporânea.

Quanto aos trabalhadores por conta de outrem, 50,4% não completou o ensino secundário, contra uma média europeia de 17, 9%.

Pensaríamos que bastaria esperar mais uns anos para que a situação se alterasse: mas Portugal destaca-se também pela elevada percentagem de reprovações escolares, o que significa que alguma coisa tem de mudar rapidamente nas condições de ensino dos jovens.

A média europeia, no que se refere a ter completado o ensino secundário, é de 75,2%; só 40% dos portugueses entre os 25 e os 64 anos o fez.

É natural que os portugueses se sintam fartos ou alheados da Europa: ela apareceu-nos, na década de oitenta do século passado, como um banco simpático que emprestava milhões a fundo perdido, e agora transformou-se subitamente num monstro cobrador.

Temo que as eleições deste domingo agravem a imagem de Portugal como país sem opinião, ou seja, abstencionista. A União Europeia não tem sabido defender-se nem valorizar-se; pelo contrário, criou um clima de guerra fria interna entre Norte e Sul.

Os ideais de solidariedade social e igualdade de direitos que fizeram da Europa um farol de conhecimento e qualidade de vida necessitam de recuperação urgente.

E Portugal precisa de dar prioridade urgente à Educação, sob pena de se tornar o pobrezinho crónico a fazer de estátua neo-realista no sofisticado jardim europeu.