“Esta é uma canção sobre a saudade”, disse Win Butler, em português, antes de iniciar ao piano ‘The Suburbs’. O concerto ia a meio mas, à semelhança das anteriores passagens por Portugal, já se desconfiava que era precisamente saudade o que os Arcade Fire iam deixar quando terminassem a actuação.
Ontem à noite, no Rock in Rio, foi a quarta ocasião que o público nacional teve para ver a banda canadiana e confirmar aquilo que já se suspeita há muito: os Arcade Fire caminham certeiros em direcção ao pódio de melhor banda ao vivo do mundo. Claro que ao lerem isto, muitas vozes se levantarão para defender uns Coldplay, mas não há outra verdade: o herdeiro legítimo deste lugar de devoção ocupado actualmente por bandas com os Rolling Stones (pelo sua longevidade) ou os U2 (pela sua consistência) são mesmo os Arcade Fire.
Praticamente sem paragens, o concerto foi de uma intensidade prodigiosa. Se, em 2007, quando Lisboa os viu pela primeira vez no SBSR, já conquistavam por esse ritmo constante, há hoje uma impetuosidade avassaladora a marcar o espectáculo. A ingenuidade que apresentavam há sete anos já lá vai e deu agora lugar a uma autoconsciência que os permite personificar, sem perderem a sua alma ‘indie’, a importância que têm no panorama musical mundial. Mais encenados, transpõem essa magnitude para palco.
Enquanto Régine Chassagne é a rainha da teatralidade, Win, o irmão William Butler e Richard Reed Parry são os maestros de uma força motora que provoca na assistência uma energia desvairada, com os quase 48 mil presentes a gritar a plenos pulmões praticamente todas as canções apresentadas, sejam elas de ‘Funeral’, ‘Neon Bible’, ‘The Suburbs’ ou do mais recente ‘Reflektor’. Quase como uma cerimónia ritualista, além das letras na ponta da língua, há muitos entre os presentes que respondem ao repto lançado pela banda no início da digressão de aparecerem ‘camuflados’. Vêem-se várias máscaras e esqueletos pintados entre a multidão.
Juntos há 11 anos, outra constatação é agora a forma mais ‘oleada’ e profissional de se apresentarem em palco, não quebrando o ritmo nem quando se verificam problemas técnicos, como o que aconteceu com a guitarra de Win Butler antes de iniciar uma canção. O vocalista resolveu o problema com mestria, continuando a recitar em jeito ‘spoken word’ a letra da composição.
Com uma formação imponente – são 12 músicos em palco -, fica cada vez mais claro que os Arcade Fire ainda podem crescer mais. Também parece evidente que para isso não se vão render às ‘regras de mercado’, facilitando a sua música com sonoridades menos exigentes. Ao longo de todo o espectáculo de ontem na Bela Vista a banda canadiana mostrou, mais uma vez, que é possível ser verdadeiro e comunicar para multidões como se de uma plateia reduzida se tratasse. E ‘Wake Up’, que fechou o alinhamento, mostrou que, com a emoção certa, ainda sabe muito bem bater palmas a compasso e cantar bem alto em uníssono. Foi para lá de arrebatador.