A alternativa de Costa

A querela interna no PS pode durar longos meses. O que pressionará António Costa a dar a conhecer o que pretende fazer se for primeiro-ministro. Uma resolução rápida da crise que ele próprio abriu permitir-lhe-ia manter no vago as suas ideias (se as tem), revelando quase só intenções, sem explicar como as irá concretizar.

Para já, Costa foi concreto apenas sobre o passado. Elogiou a visão estratégica de Guterres e o reformismo de Sócrates. São meias verdades. Guterres foi brilhante na apresentação da Agenda de Lisboa em 2000, mas esta falhou os seus objectivos – tornar em dez anos a economia europeia a mais competitiva do mundo. Afinal, a economia da UE é, hoje, ainda menos dinâmica do que era então. 

Sócrates foi reformista nos primeiros dois ou três anos como primeiro-ministro. Escrevi na altura que ele reformava mais do que qualquer dos seus antecessores. E reduziu o défice orçamental. Só que tudo isso mudou a partir de certa altura, sobretudo com vista às eleições de 2009. A despesa pública megalómana que se seguiu contribuiu para que as contas externas de Portugal chegassem a um défice à volta de 10% do PIB, financiado por crédito estrangeiro, que nessa fase era fácil e barato. Essa política levou-nos à beira da bancarrota e à austeridade que os credores impuseram.

Era importante conhecer se A. Costa pretende repetir tal política, o que implica saber o que pensa sobre os grandes problemas da nossa situação económica e financeira.

Vejamos alguns exemplos. Costa defende o Estado social, claro. Mas não diz como o tornará financeiramente sustentável. Foi nessa área, aliás, que o reformismo inicial do executivo de Sócrates melhor se manifestou, com a reforma da Segurança Social de Vieira da Silva, que cortou alguns benefícios. Se vencer, irá Costa opor-se a cortes nas principais despesas do Estado (salários, pensões, apoios sociais), rejeitando simultaneamente impostos elevados?
 
Se a resposta fácil for o crescimento económico, deverá Costa explicar o lado difícil da questão: como será financiado esse crescimento, se as empresas privadas portuguesas são as mais endividadas da Europa, o crédito bancário – mesmo com as medidas do BCE – continuará caro e pouco acessível, e o Estado precisa de baixar o seu défice, o que limita o investimento público.

E há o enorme constrangimento da dívida. Não pagar? Reestruturá-la? Como convencer os investidores externos a comprar dívida soberana portuguesa, se o vendedor, o Estado, der sinais de que não a pagará, pelo menos integralmente?  
Costa já criticou o Tratado Orçamental, que tem exigências duras quanto à redução do défice e sobretudo da dívida do Estado, mas foi apoiado pelo PS. E quer acabar com a austeridade. Para isso terá de mudar a orientação ‘germânica’ da UE. Hollande prometeu fazê-lo e deu no que se sabe. 

A ideia talvez seja promover uma frente com os líderes de outros países periféricos para enfrentar Merkel. Ora o único líder com força política é Renzi, primeiro-ministro de Itália, que programou um conjunto de reformas no seu país – mas precisa ainda de as concretizar.  

No limite, os portugueses têm o direito de saber se um A. Costa primeiro-ministro irá encarar a hipótese de sair do euro, como desejam vários dos seus apoiantes. De retórica inconsequente já andamos todos fartos.