Mas a pesada derrota frente à Alemanha (4-0), apesar de obrigar a cuidados urgentes – não apenas físicos, mas também psicológicos -, não hipotecou a passagem à próxima fase. Ainda não é um KO. E o orgulho ferido até pode servir para mostrar outra cara frente aos Estados Unidos, no domingo (23h, RTP 1 e SportTV 1), e ao Gana, na quinta-feira (17h, RTP 1 e SportTV 1).
É pelo menos essa a convicção do seleccionador Paulo Bento – “É na adversidade que vamos ver quem somos” – e de Jorge Silvério, doutorado em Psicologia do Desporto.
“Por estranho que pareça, esta derrota, embora por números pesados, pode dar confiança. Porque deixou-nos sem margem de manobra. Agora a única hipótese é ganhar os dois próximos jogos e normalmente, tendo em atenção o historial da nossa Selecção, a reacção perante estas situações é positiva”.
Em declarações ao SOL, Silvério sublinha que, apesar de não ser adepto de estereótipos, “há um grande número de portugueses que funciona assim”. Reage quando se vê em apuros em vez de evitar os problemas à partida. Não é preciso recuar muito no tempo para a equipa das quinas lhe dar razão.
Ao longo da fase de apuramento para o Mundial, Portugal andou sempre no limite. De tal forma que o ponto somado em Israel e os triunfos no Azerbaijão e na Irlanda do Norte se tornaram preciosos para manter a esperança. Na recepção à Rússia também era imperioso ganhar e assim aconteceu. E ainda que não tenha dado para mais do que jogar o playoff, a resposta frente à Suécia de Ibrahimovic evidenciou outra vez o lado bom da equipa.
Durante as fases finais dos Europeus de 2004 e 2012 também foi possível dar a volta ao texto: em ambos os casos a Selecção entrou a perder e acabou por atingir a final, no primeiro, e as 'meias', no segundo. Paulo Bento já o lembrou – sendo que a maior parte dos jogadores que levou ao Brasil estava presente há dois anos.
“É uma vantagem”, observa Jorge Silvério, para quem o foco deve centrar-se no facto de os objectivos continuarem ao alcance, “provavelmente a ferramenta motivacional mais poderosa”.
Mente fraca, objectivo intacto
Frente aos alemães, depressa a equipa se deixou levar pelo rumo negativo dos acontecimentos. Foi notória a quebra anímica ao primeiro impacto. Penálti para a Alemanha, golo e adeus Portugal. Tinham passado 12 minutos do apito inicial.
A fragilidade mental da equipa ficou depois patente na expulsão de Pepe, na excessiva preocupação com o árbitro (muitas vezes com razão, mas de que adianta?) e numa apatia gritante perante o avolumar da goleada.
“Logo no penálti revelou-se um descontrolo emocional. Sentindo essa decisão do árbitro como uma injustiça, a equipa teve dificuldade em manter o nível de jogo e a concentração, o que se agravou com a expulsão de Pepe”, analisa Jorge Silvério, sublinhando que existem treinos específicos para evitar situações como esta, que redundou numa espécie de depressão colectiva até ao apito final.
Euforia à volta da equipa, cansaço mental e uma condição física periclitante que pode gerar dúvidas nos próprios jogadores são possíveis causas do problema, mas “só quem está por dentro poderá tirar essas conclusões”, avança o psicólogo especializado em desporto.
Para os embates com norte-americanos e ganeses, será importante trabalhar o aspecto mental, no sentido de agregar os jogadores em torno de uma ideia: “Nada está perdido”.
Paulo Bento começou a fazê-lo logo na segunda-feira após o jogo. “Estamos proibidos de desistir do nosso objectivo”. Falta saber se a mensagem passará para dentro de campo no domingo. Um golo inicial dos Estados Unidos, depois do que se viu na estreia, carrega o risco de fazer desabar tudo o que sobra de confiança.
Com a derrota frente à Alemanha, não só a Selecção nacional desperdiçou os três pontos em jogo, como ficou em maus lençóis no que respeita ao saldo de golos, o primeiro critério de desempate na fase de grupos. Duas vitórias nos jogos que restam é a única via realista para garantir a qualificação e ainda assim poderiam não chegar.
É por isso que nem um triunfo magro sobre os norte-americanos – que já levam três pontos graças à vitória sobre o Gana (2-1) – será suficiente para entrar desde logo nos dois lugares que dão acesso aos oitavos-de-final. Seria necessária uma margem de três golos de diferença. Um cenário ainda assim mais verosímil será conseguir bater os States e o Gana e acreditar que os primeiros não vencem a Alemanha na última jornada.
Nesse caso, acabariam três selecções empatadas em pontos e Portugal poderia sair prejudicado por ter sofrido quatro perante os germânicos.
“Há que reconhecer que agora a pressão será maior, mas não é a primeira vez que estamos pressionados para passar uma fase de grupos”, lembrou Paulo Bento, que devido a problemas físicos não poderá contar com Fábio Coentrão até ao fim do Mundial, nem com Rui Patrício e Hugo Almeida no que resta da fase de grupos.