Sempre tivemos uma boa relação profissional, que se estendeu por dez anos. Devo-lhe, além disso, alguns favores pessoais. E o facto de eu ser velho amigo da mulher com quem ele era casado na altura, Margarida Marante, alargava o campo das nossas relações. Visitei-o nas suas propriedades, primeiro perto de Évora e depois em Reguengos, e ele visitou-me no meu modesto monte de Estremoz.
Aquando do nascimento do SOL, Granadeiro, que já era presidente executivo da PT, facilitou-nos a instalação de meios técnicos necessários ao lançamento do jornal, sem os quais o arranque teria sido impossível. E este gesto teve tanto mais significado quanto é certo que muitos fornecedores de serviços, pressionados pela concorrência, nos dificultaram a vida ao máximo.
Anos depois, no complicado processo Face Oculta, Granadeiro terá tido uma actuação menos clara (em consonância com o nome do processo…), dispondo-se a colaborar numa operação duvidosa para satisfazer a vontade do primeiro-ministro da época, José Sócrates.
Como se sabe, Sócrates instigou a PT a comprar a TVI, para afastar José Eduardo Moniz e Manuela Moura Guedes.
Neste caso terá tido um papel decisivo Ricardo Salgado, um assumido apoiante do então primeiro-ministro.
Entre o BES, a PT e o Governo socialista estabeleceram-se então ligações perigosas, com trocas arriscadas de favores, tais como o banco assumir dívida soberana portuguesa para lá do que seria razoável.
Entretanto, se as relações entre Salgado e Sócrates eram recentes, os laços entre Granadeiro e Salgado eram antigos.
É sabido que passavam férias juntos, num grupo de amigos de que também fazia parte Marcelo Rebelo de Sousa.
E Salgado sempre ajudou Granadeiro, no qual via um homem da máxima confiança, tendo tido, por exemplo, um papel determinante na sua escolha para a presidência da PT.
Mesmo nos momentos mais difíceis, Salgado não deixou cair Granadeiro.
É pois natural que, quando a crise no Grupo Espírito Santo rebentou, Ricardo Salgado tenha recorrido ao seu amigo e à PT.
O GES tinha dívidas a saldar, tinha empréstimos a liquidar, precisava desesperadamente de dinheiro.
Salgado teve de apelar a toda a gente que conhecia para o ajudar naquela enrascadela – e muitos voltaram-lhe as costas.
Mas Henrique Granadeiro não o podia fazer.
Perante aquele quadro aflitivo, Granadeiro dispôs-se a saldar o apoio recebido de Ricardo Salgado ao longo dos anos, prontificando-se a aumentar as aplicações da PT no Grupo Espírito Santo para o valor astronómico de quase mil milhões de euros – o que significava uma temeridade, pois a situação calamitosa do GES não oferecia quaisquer garantias.
No mínimo, pode dizer-se que Granadeiro assumiu um risco excessivo, foi imprudente, cometeu um acto de racionalidade duvidosa.
A questão é que aqui não terá falado o gestor – falou apenas o amigo.
A ajuda que Granadeiro deu a Salgado foi uma ajuda de amigo, a retribuição de uma amizade antiga.
Só que isso, sendo louvável no plano humano, não é razoável no mundo dos negócios.
Até porque uma pessoa só pode ajudar com aquilo que é seu – e não com os meios de uma empresa que tem milhares de accionistas.
Lá diz o velho ditado: «Amigos, amigos, negócios à parte».
Quando estava no Expresso, Granadeiro usava muito outro aforismo que significa exactamente o mesmo: «Serviço é serviço, conhaque é conhaque».
Neste caso da ajuda ao GES, Henrique Granadeiro misturou o serviço com o conhaque – e estragou tudo.
Porque nem o amigo se salvou nem ele ficou em bons lençóis.
Talvez se tenha salvo a amizade.
Esperemos, de facto, que essa saia incólume da alhada em que a PT está metida e da tragédia que é o naufrágio de um grande grupo financeiro português.
Ao menos, que Ricardo Salgado e Henrique Granadeiro possam continuar a passar férias juntos, talvez com mais tempo para trocarem memórias.