Brasil: Em Osasco, Dilma tentou campanha com menos Lula

No calçadão de Osasco, município na periferia de São Paulo, Dilma Rousseff tem votos garantidos. A Prefeitura (Câmara Municipal) está no domínio do Partidos dos Trabalhadores (PT) há muitos anos e aqui, na zona Oeste da capital paulista, concentra-se um forte movimento sindicalista criado à volta da indústria da cidade. 

O terreno é fértil para o PT e talvez por isso Lula da Silva foi o grande ausente numa manhã em que a candidata a novo mandato no Palácio do Planalto passou pela quarta vez na grande São Paulo em apenas uma semana. Motivo: os níveis de rejeição a Dilma no maior colégio eleitoral do país, onde votam 22% dos 136 milhões de eleitores do Brasil, é grande e até ao dia das eleições, a 5 de Outubro, a comitiva regressa para novas acções de campanha.

As ruas de Osasco, onde vivem cerca de 700 mil habitantes, são a montra de um novo Brasil do qual o PT reclama a paternidade. O comércio no calçadão é vivo e recomenda-se. Não faltam ofertas de emprego e nas lojas de pronto-a-vestir o marketing comercial é seguido à risca para aumentar as vendas: se o cliente não pode pagar de uma só vez, compra parcelado. O mesmo é dizer, paga às prestações. “O Brasil mudou nos últimos 12 anos porque o povo teve a sua vez. 36 milhões de brasileiros foram tirados da pobreza. 42 milhões foram elevados à classe média. Fomos nós que fizemos isso. Quando digo ‘nós’ falo de mim e do Presidente Lula”, não evitou Dilma Rousseff, já durante o comício que se seguiu à arruada calçadão a baixo e na qual participaram centenas de apoiantes da candidata.

Jornalistas brasileiros que acompanham o Partido dos Trabalhadores garantem que a massa de homens e de mulheres que grita por Dilma são militantes, simpatizantes ou apenas eleitores do PT. Afastada parece estar a hipótese de alguns deles serem figurantes contratados pela máquina da propaganda petista. Maria José, 59 anos, ouve o discurso de Dilma Rousseff, que falou depois de Alexandre Padilha, candidato a governador do São Paulo, e de Eduardo Suplicy, histórico senador federal em Brasília e candidato a novo mandato. Ao SOL, Maria José admite que esperava ver Lula da Silva retomar um palco que lhe é familiar. “Ah, o presidente Lula é diferente. Ele sabe como falar e sabe como tocar no coração da gente. Ele tem carisma e Dilma não tem”, começa por comparar. “Os meus pais foram presos políticos na ditadura. A presidenta Dilma também. Penso que é isso que faz com que o povo brasileiro vote dela. Porque as políticas são do Lula. O que o povo gosta é da política do Lula”, acrescenta.

Maria José é funcionária num centro de saúde. Recepciona e faz o registo dos utentes. Recebe 1100 reais (358 euros) por mês. É considerada classe média. Mas as contas, todos os dias, são de subtrair. Tem quatro filhos. Todos eles formados. “Foi preciso trabalhar muito no duro para dar escola para eles. Agora só penso no meu futuro. Como vou viver só com este dinheiro. Os impostos não descem e a vida está cara, está muito cara”, explica, enquanto Rousseff, do alto do palanque, recorda que o Senado em Brasília aprovou uma lei que canaliza parte dos lucros com o petróleo para investimentos na educação e na saúde, neste último sector para levar mais médicos às cidades onde a falta de profissionais de saúde é gritante.

Na capital do hot-dog, como é conhecida Osasco, só no calçadão estão 30 postos de cachorro quente. “Só Nova Iorque tem mais do que a agente. Mas os nossos são melhores. Poder ter certeza”, atira uma jovem de pouco mais de 20 anos, que trabalha numa destas bancas, quando não está na Universidade, para ajudar no orçamento familiar. Dilma, que começara o seu discurso por prometer que não regressaria a Brasília sem comer o lanche típico da cidade, elogiou o empreendedorismo dos habitantes, “gente de família mas também empreendedora, como se vê pelas banquinhas de cachorro-quente”, frisou.

Agora que a campanha começa a sério, Dilma foi para a rua sem o seu padrinho político. Lula, ao que o SOL apurou, estaria a gravar os tempos de antena do partido que começam a ser emitidos a partir de dia 18 de Agosto. Ainda assim, a candidatura do PT sabe que é indispensável a presença do ex-Presidente do Brasil ao lado da candidata. Mas essa colaboração mais visível só deverá acontecer em momentos mais concretos e mais próximos das eleições, para captar o voto dos indecisos. Lula continua com um capital invejável no “cinturão petista”, como chama a imprensa brasileira. O speaker do comício, volta e meia nas pausas entre as várias interneções da manhã, não deixou de recordar os eleitores: “Vamos todos votar em Dilma, a mulher em quem o Presidente Lula confiou o Brasil”.

ricardo.rego@sol.pt em São Paulo