De acordo com o jornal Financial Times, as autoridades chinesas abordaram vários responsáveis dos Estados Unidos no ano passado para debaterem um possível trabalho conjunto na construção de uma barragem na República Democrática do Congo, uma obra de 12 mil milhões de dólares, mas as conversações aprofundaram-se durante a cimeira anual China-Estados Unidos em Pequim, no mês passado.
A notícia surge numa altura em que a China enfrenta acusações cada vez mais fortes de apenas apostar em África para aumentar o mercado para as suas empresas, que assim ganham um mercado internacional que de outra forma teriam de disputar.
A China privilegiou uma abordagem mais multilateral no princípio deste ano, quando lançou um fundo de 2 mil milhões de dólares junto do Banco Africano para o Desenvolvimento, que obrigava as companhias chinesas a concorrer contra outras pelos empréstimos a taxas de juro mais baixas.
Este valor, no entanto, é apenas uma pequena parte dos 200 mil milhões de dólares que a China canalizou para África no último ano, de acordo com os números apresentados pelos responsáveis chineses.
A proposta chinesa é encarada com reservas em Washington, dadas as acusações de corrupção, falta de transparência e relações suspeitas com os dirigentes africanos, e por isso os responsáveis norte-americanos citados pelo Financial Times garantem que não há nenhuma decisão já tomada.
O receio norte-americano prende-se com as reacções frequentes e geralmente críticas para com o 'modus operandi' da China, que fornece não só empréstimos com taxas de juro tão baixas que levaram o ministro das Finanças da Nigéria a chamar-lhes "free money", mas também oferece, literalmente, infra-estruturas importantes e vistosas a troco de acesso directo aos fornecimentos de energia.
Este 'oil for money' é, aliás, um processo tão produtivo que Angola, por exemplo, já vende 45% da sua produção à China, país que vai a África buscar 15% da sua energia.
Para além da energia, a China aposta em África num modelo de 'chave-na-mão', ou seja, leva tudo o que precisa para a obra, sejam trabalhadores, parafusos ou grandes estruturas, recebendo, por isso, críticas dos parceiros internacionais de África, que acusam o país de apenas ir lá buscar os recursos naturais, não fornecendo nem treino nem 'know-how' aos africanos, e assim perpetuando a 'dependência', leia-se modelo de negócio.
Em entrevista recente à Lusa, a investigadora radicada na África do Sul Lucy Corkin explicou que o problema da relação entre os governos africanos e a China é, sobretudo, de percepção política, não só pela opinião pública interna, mas também pelas organizações não-governamentais, que criticam a falta de transparência dos contratos e, muitas vezes, o resultado final das obras em termos de qualidade.
No entanto, defende, a 'culpa' não pode ser atribuída só a um lado, uma vez que a ajuda financeira chinesa é dada mais depressa e sem burocracia do que a maioria dos outros países do Ocidente: "do ponto de vista africano, a chinesa é melhor, mas se a ajuda for analisada por um parlamento ou uma ONG, há logo uma imensa controvérsia sobre os dinheiros chineses, desde logo porque não passam pelo 'due process', por isso há um sentimento de falta de transparência, e estas organizações prefeririam empréstimos ocidentais".
Lusa/SOL