A ideia, aparentemente justa, de que grandes males exigem grandes remédios esconde, muitas vezes, os efeitos nefastos de certas curas cegas que chegam a matar tanto como a doença. Como se houvesse algum bem sem sombra de mal em toda a manifestação da natureza humana. É isto que mais me assusta quando ouço garantir curas, doam elas à quem doerem.
A experiência de vida ensina que é sempre preferível encontrar a solução que cause menos dores, sem preocupações de justiceirismos absolutos e sem a ilusão de garantir que a ruptura entre o bom e o mau colocará frente a frente o branco imaculado à mais completa ausência de cor.
Na prática, e no exemplo mais recente do nosso universo financeiro, aquele que anda nas bocas do mundo e nas primeiras páginas dos jornais e dos telejornais, o que seria verdadeiramente significativo e um sinal positivo para todos era garantir as expectativas normais de todos aqueles que são alheios à anormalidade detectada.
O que seria importante é que, no universo daqueles que por direito próprio foram colocados no lado dos bons, nenhuma acção esperada que exigisse a intervenção da instituição financeira em causa pudesse ser adiada sob o pretexto do momento. Este cuidado é fundamental até para a consolidação da confiança que a situação naturalmente pede.
A mais pequena das escrituras adiadas, por menor que seja o respectivo valor, agiganta-se numa situação como a que vivemos e pode projectar sombras muito negativas sobre as expectativas que todos temos para as soluções que queremos e o país merece. Mesmo quando o atraso possa ser, realmente, pouco significativo, nunca será subjectivamente insignificante e isto conta muito.
Os falsos gémeos nascidos da mais famosa cesariana financeira ocorrida em Portugal precisam deste clima de confiança para sobreviverem, mesmo considerando o que conseguiu melhores condições de sobrevivência e parece embalado para resistir, num esforço que é sempre mais decisivo nos primeiros tempos de vida.
Tudo o que, objectiva ou subjectivamente, vá em sentido contrário, ou seja, lance as sementes da desconfiança, interna e externa, não só inviabilizará uma solução que parece a mais necessária como porá em causa – e com efeitos retroactivos – os resultados que supostamente já alcançamos no termo de um longo processo de sacrifícios colectivos que aliás parecem prosseguir.
Sem querer transformar esta minha opinião numa falsa fábula, e muito menos numa fábula moralista, termino reafirmando, pragmaticamente, o que defendi no início – que ao menos saibamos optar por um parto sem dor. Sem falsos e por demais injustificados pruridos de arrependidos dos últimos tempos.
*Presidente da APEMIP, assina esta coluna semanalmente