Todos ganham neste circuito: os depositantes (porque recebem juros), o banco (porque tem um lucro), e a economia (porque beneficia de capital para investir).
O sistema baseia-se naturalmente na confiança: só depositamos o nosso dinheiro nas mãos de alguém que seja fiável.
Ora, para reforçar essa confiança, o Estado assume o papel de supervisor, de modo a garantir que tudo se passa dentro da lei e no respeito pelas boas práticas.
É evidente que, deste modo, se gera alguma promiscuidade entre o público e o privado: os bancos são privados mas o
Estado pode intervir neles, indo ao ponto de substituir as administrações, como sucedeu no BES.
Dado o seu peso simbólico, uma crise num banco é sempre uma machadada no capitalismo.
Assim, mal deflagrou a crise no BES, o Partido Comunista aproveitou para vir dizer que os bancos deviam ser todos públicos.
Ora, isso não faz sentido, por dois motivos:
Primeiro, porque não evitaria as irregularidades: muitos dos escândalos de corrupção do nosso tempo têm lugar em instituições públicas (veja-se o caso dos submarinos).
Segundo, porque colocaria o financiamento da economia nas mãos do Estado, isto é, dos governos, com todas as suspeições de favorecimento daí decorrentes.
Portanto, tem de haver banca privada e tem de haver supervisão – que, no entanto, não é infalível nem nunca será.
Assim, é um erro afirmar, como alguns fazem, que «a responsabilidade última é do regulador».
Não é.
A responsabilidade é sempre de quem comete os actos.
Atirar a responsabilidade para cima do regulador, desculpabilizando quem tomou as decisões, é pôr o mundo de pernas para o ar.
É o mesmo que dizer, quando há um roubo, que a culpa não é do ladrão mas da Polícia – pois não foi capaz de evitar o roubo.
Não confundamos as coisas!
Certos partidos e alguns colunistas falaram também de «falta de transparência» nalguns momentos do processo.
Isto decorre da ideia, errada mas muito difundida, que numa democracia não tem de haver reserva, nem confidencialidade, nem discrição, e que tudo deve ser discutido na praça pública.
Ora, trata-se de um perigoso equívoco.
Nos assuntos de Estado, tem de haver muitas vezes reserva, confidencialidade e discrição.
E, em casos delicados como este, isso ainda é mais necessário.
A devassa geral é inimiga da democracia e contribui para a sua destruição.
Democracia não significa escarrapachar tudo nos media, como fez Assange.
Isso é voyeurismo.
Infelizmente, muitos dos que clamaram por transparência apenas queriam fazer chicana política à custa da desgraça do BES.
Será que o PS, o PCP ou o BE quiseram alguma vez contribuir para melhorar a solução encontrada?
Não.
O que se viu foi uma tentativa pouco subtil de aproveitamento político, em que ninguém se preocupou com as consequências que isso teria na desvalorização (ainda maior) do banco.
As chamadas ao Parlamento da ministra das Finanças e do governador do Banco de Portugal não tinham por objectivo esclarecer dúvidas e acalmar os espíritos – antes pretendiam envolver no caso as autoridades e ampliar o ‘escândalo’, aumentando a intranquilidade das pessoas e agravando o problema.
Neste caso do BES, julgo que, desde o princípio, ficou claro para toda a gente que o Banco de Portugal e o Governo actuaram tendo em vista dois objectivos:
1. Salvar o banco naquilo que havia a salvar, para garantir o dinheiro dos depositantes e evitar o chamado risco sistémico;
2. Salvaguardar o mais possível o dinheiro dos contribuintes, não nacionalizando os prejuízos, como aconteceu no BPN.
Penso que toda a gente percebeu que a intenção foi esta.
Se os objectivos vão ser alcançados, é outra questão.
Mas também é certo que ninguém apresentou alternativas às soluções adoptadas, o que significa que não tinham propostas melhores.
Sejamos claros: o que a oposição fez, desde que o caso do Grupo Espírito Santo rebentou, foi tentar torcer as coisas de modo a culpabilizar Carlos Costa, Maria Luís Albuquerque e o próprio Passos Coelho.
Foram estes que a oposição quis apanhar nas curvas, pois são estes os seus inimigos.
Que, nesta culpabilização, saiam desresponsabilizados os responsáveis pela gestão do banco, a começar por Ricardo Salgado, isso pouco importa.
O que interessa é fazer política à custa desta tragédia.
Mas, se é compreensível que o PCP e o BE tenham este comportamento, pois são partidos anti-sistema, já o mesmo não se pode dizer do PS.
No caso do BES, o Partido Socialista deveria ter estado do lado da solução e não do lado do problema.
Deveria ter estado ao lado do Banco de Portugal a serenar os ânimos – e não ao lado do PCP e do BE a disparar tiros no escuro.
Por razões de pequena política, o PS agiu neste caso de modo altamente irresponsável.
O que é um péssimo cartão-de-visita para um partido que aspira a ser amanhã Governo.