Perante a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, a procuradora-geral da República, Joana Marques Vidal, manifestou que há "toda a conveniência na autonomização do crime" de MGF.
Reconhecendo que, "no essencial", o crime de MGF já está consagrado na lei, como ofensa a integridade física grave, a procuradora destacou que "há outras razões" para justificar a alteração do Código Penal em discussão no Parlamento.
Dado que se trata de "uma realidade muito escondida e pouco conhecida, é da maior importância que um crime a tipifique autonomamente e permita, assim, uma aplicação da lei mais uniforme", sustentou.
O parecer da Ordem dos Advogados vai no mesmo sentido.
Ouvido na mesma comissão, Rui Silva Leal, vice-presidente do Conselho Geral da 0rdem, admitiu que, na "discussão ampla" entre os advogados, "houve quem discordasse da autonomização" do crime, mas frisou que prevaleceu a natureza de "flagelo mundial" da MGF, que afeta 140 milhões de mulheres e, anualmente, coloca em risco três milhões de meninas.
A Ordem entende, porém, que aqueles/as que incitam à prática de MGF, ou disponibilizam os meios ou recursos para que ela seja praticada, devem estar sujeitos à mesma moldura penal, de três a doze anos, prevista para quem, efetivamente, a realize, posição que não encontrou unanimidade entre os deputados.
"A Ordem entende que incitar é o principal processo desencadeador deste tipo de conduta", justificou Silva Leal.
As audições de hoje abordaram ainda outros crimes relacionados com violência de género.
A procuradora-geral exprimiu "sérias dúvidas que haja, neste momento, utilidade na transformação da violação em crime público", mas, por outro lado, considerou "importante que se consagre o 'stalking' [assédio repetido] como crime", dado que o atual Código Penal não o abrange.
Silva Leal concordou com a autonomização do crime de 'stalking", à semelhança do que estão a fazer outros países europeus, mas reconheceu que "a sua redação seja algo complicada, porque existem várias formas de perseguição".
Porém, o advogado adianta que poderão vir a ser adotadas "medidas de coação do género das que já existem para a violência doméstica", no sentido de afastar o agente da vítima.
Silva Leal realçou que o assédio sexual já está "devidamente protegido" no Código Penal e, por isso, "não deveria ser autonomizado" como crime.
Por outro lado, defendeu perante os deputados uma moldura penal específica para o casamento forçado.
Lusa/SOL