Julgamentos populares via SMS

Há uns bons anos passei várias tardes no arquivo do Diário de Notícias à procura de artigos antigos que versassem sobre mortes violentas, nomeadamente as praticadas por grupos de pessoas (linchamentos), na sequência de julgamentos populares. Encontrei muitos mais casos dos que esperava, mas já se sabe que a raça humana revela o seu lado…

Ao contrário desses tempos – onde as mortes físicas eram violentas, com o recurso ao uso de sachos, pedras e outros objectos cortantes -, na actualidade, muitos dos julgamentos populares dão-se apenas com o recurso a palavras, ditas ou escritas. Quem quer assassinar moralmente alguém dispara nas redes sociais algumas mentiras, ou então passa para os jornais mais dados  ao sensacionalismo informações descontextualizadas, com o propósito de denegrir a imagem de quem não se gosta. O mais comum é falar-se de dinheiro. 'O fulano tal, que se dizia preocupado com os pobres, afinal tem um ordenado bem chorudo', escreve-se e publica-se nos jornais e nas redes sociais com a mesma ligeireza de um sms.

Esta semana a vítima foi Vítor Bento, o homem que liderou, por breves meses, o Novo Banco, ou antigo BES, como se preferir. Se durante algumas semanas foram publicadas várias notícias favoráveis ao gestor,  desde a sua demissão do Novo Banco que a história mudou. O ex-homem forte do sistema de multibanco viu o seu nome escarrapachado nos jornais como tendo uma reforma de 5 mil euros. 'Malandro', faltou dizer-se. É extraordinário esta mentalidade mesquinha.

Alguém disse quanto é que descontou desde que trabalha? Há quantos anos o faz? A reforma é assim  tão chocante para um homem que deve ter descontado fortunas? Se bem me lembro, uma antiga personalidade televisiva ganhava mais de 60 mil euros por mês e poucos o atacaram. E o que dizer de alguns ex-banqueiros que ganham mais de 150 mil por mês? Qual a razão de alguém ter 'dado' essa notícia a um jornal? Pode sempre argumentar-se que tem apenas 60 anos e, por isso, é imoral. Não vou por aí, embora haja quem aos 60 anos já tenha mais de 40 de descontos…

Os julgamentos populares são cada vez mais a prática das redes sociais e dos jornais. Entre informação verdadeira e falsa não falta quem queira atirar achas para a fogueira. Os duelos já não são de espada nem pistola, mas sim de teclados ou de palavras impressas ou registadas num computador anónimo.

vitor.rainho@sol.pt