Alentejo rima com tempo – e sempre ouvimos dizer que o tempo aqui passa mais devagar, que a calma impera. Por isso, achei que eu e aquela rede havíamos de ser amigas inseparáveis: no Inverno durante a tarde a ler, coberta com uma mantinha; no Verão, ao fim da tarde, com a companhia de um copo de vinho branco fresquinho, e à noite a pensar a vida.
Era para ser uma rede para cada um, mas a lista estava tão recheada de coisas básicas, e o dia seguinte era tão incerto, que achámos que uma só, naquela altura, ia ter de chegar. Depois, em caso de conflito de interesses, tirava-se à sorte. E só quando fosse possível compraríamos outra para duplicar o prazer de nos refastelarmos na varanda a contemplar o pôr-do-sol, a discutir os nossos planos para o futuro ou a teorizar sobre a vida em geral.
Mas nunca houve qualquer conflito de interesses. Nem sequer teve de haver qualquer cedência. Nada disso. Ao fim de um ano e alguns meses, calculo que me tenha sentado na rede uma meia dúzia de vezes – e só numa ocasião lá estive deitada mais de dez minutos.
Foi a meio da tarde, tinha-me levantado cedo nessa manhã, e quando cheguei a casa achei que era o momento ideal para aproveitar a dita cuja. Na realidade, dormitei só o tempo suficiente para perceber que aquilo, afinal, não dá jeito nenhum para dormir. Se tivéssemos comprado duas redes, hoje as duas estariam… às moscas.
A mudança da cidade para o campo traz sempre associada a ideia de que no campo teremos mais tempo, que o tempo passa mais devagar, que tem mais valor. É quase como um dado adquirido. Só não sei exactamente que pessoas têm 'mais tempo'.
A verdade é que vínhamos preparados para viver com pouco dinheiro mas não para viver com pouco tempo – e é isso que tem acontecido.
Somos uma geração de equilibristas. Vamos equilibrando ora muito tempo com pouco dinheiro, ora mais dinheiro com pouquíssimo tempo.
Rodamos o prato do emprego por conta de outrem, que é aquele que nos permite ter um tecto sobre as nossas cabeças, comida no frigorífico, comprar um livro, uma revista, ir ao cinema ou ao teatro e viajar de vez em quando.
Simultaneamente, rodamos os pratos dos nossos projectos pessoais: as coisas que gostamos de fazer e que nunca darão dinheiro e as coisas que gostamos de fazer e que, com o devido empenho, um dia nos darão independência financeira e a possibilidade de sermos o nosso próprio patrão.
E ainda o prato dos momentos que dão significado à vida: o tempo que passamos com a família e com os amigos, ou mesmo a sós. E depois é tentar andar sem deixar cair nada. Entretanto, na gaveta vão ficando os projectos de fotografia e costura mais arrojados e algumas remodelações necessárias mas adiáveis. Toda uma lista de tarefas à espera de dias com mais tempo, sabendo com toda a certeza que o tempo perdido, ao contrário do dinheiro, é impossível de recuperar.