Escândalo: Passos Coelho não leu o” Principezinho”!

1. Alguns órgãos da comunicação social continuaram na passada semana (e ainda na presente) a saga da relação de Passos Coelho com a Tecnoforma. Uma revista de referência colocava mesmo em grande destaque a vida não contada ou ocultada do actual Primeiro-Ministro: esperava-se, então, revelações bombásticas. Revelações que quebrassem qualquer possibilidade de Passos Coelho voltar…

2. Do que pudemos perceber, Passos Coelho terá falado com alguns autarcas para viabilizar certos projectos. No entanto, essa ligação não é imputada a Passos Coelho – é imputada à ONG que seria financiada pelo Tecnoforma. Ora, este é o primeiro ponto fraco da investigação – pretende-se atacar Passos Coelho, mas nenhuma investigação (até ao presente momento) conseguiu demonstrar a ligação de Passos Coelho a actividades ilícitas ou menos transparentes. Quanto muito, tais investigações conseguem levantar suspeitas sobre a actividade da ONG (de um Centro Português para a Cooperação) – sem, no entanto, apontar para qualquer acto criminoso praticado pela empresa. 

3. Pelo contrário: julgo que foi mesmo uma revista de referência que elencou uma série de actividades da ONG – o que significa que, afinal, (ao contrário do que vinha sendo escrito), a ONG sempre tinha actividade! A actividade era inútil? Poderá ter sido. A actividade da ONG era uma forma de obter financiamento para a Tecnoforma? Talvez. Todavia, estas condutas , só por si, não consubstanciam nenhum ilícito criminal. Portanto, a tese da teia de conspirações e ligações que nasceriam e acabariam no Primeiro-Ministro – é autodestrutiva, peca por incoerências internas que a descredibilizam. 

4. Aliás, não por acaso, os portugueses foram completamente indiferentes ao caso Tecnoforma. O tema rapidamente nasceu – o tema rapidamente morreu. O que mostra o efeito da voracidade mediática e do fluxo informativo na política hodierna: a agenda política está em constante mutação. Não pára! 

5. Esta indiferença dos portugueses revela, igualmente, dois sentimentos que os nossos concidadãos nutrem face ao poder político: 1) uma enorme descrença no sistema político e nos seus agentes, traduzida na expressão muito popular: “são todos iguais/comem todos do mesmo”. É que são muitos escândalos: Pedro Santana Lopes com os rumores que surgiram na campanha, com as suspeitas que Santana Lopes alimentou contra José Sócrates, as peripécias do seu Governo; depois, José Sócrates, que foi um democrata descontente com a democracia e, por conseguinte, o seu sonho era ser o ditadorzinho das Beiras – e agiu em conformidade, tentando, por exemplo, encerrar o SOL e destruir a TVI (isto para não falar da licenciatura, das casas da Covilhã, dos cheques, etc, etc…) – e agora Passos Coelho. 

6. Ainda por cima, quem provocou a entrada em cena do casou Tecnoforma cometeu um erro de raciocínio político fatal. É que nem teve topete para disfarçar a situação bizarra de esta tentativa de escândalo coincidir absolutamente com a eleição de António Costa como candidato a Primeiro-Ministro e líder do PS de facto! Os factos remontam há cerca de vinte anos – e só agora, com António Costa prestes a ser líder socialista, com o Governo na recta final da legislatura, é que se lembraram (azar dos Távoras! Sorte divina para outros!) que Passos Coelho andava metido numa ONG, cuja actividade era discutível! História essa que já estava disponível algures na blogosfera desde…2010!!! 

7. Qual foi a finalidade do caso Tecnoforma? Na nossa perspectiva, duas: 

i) Fragilizar Passos Coelho, porque, objectivamente, estas histórias têm um efeito erosivo na pessoa do Primeiro-Ministro e, por consequência, em todo o Governo e desviam as atenções dos portugueses do essencial: da procura das soluções para resolver os graves problemas do nosso país. Ora, falar do nada, desviar as atenções do essencial, assentou que nem uma luva à estratégia de silêncio do António que acabara de dar à costa; 

ii) Destruir António José Seguro. É que este caso da Tecnoforma permitiu alimentar a narrativa dos apoiantes de Costa e da intelligentsia costista, segundo a qual Seguro foi sempre demasiado brando na oposição. Recorde-se que a última intervenção de Seguro em debates parlamentares foi precisamente sobre este tema: Seguro, a contragosto, teve de radicalizar o discurso – saindo-se muito mal e gozado até pelos próprios socialistas! Caro leitor, lanço-lhe o seguinte desafio: pensemos por uns segundos se António Costa falou alguma vez sobre o caso Tecnoforma…Falou? Não! Muito curioso! Muitíssimo curioso, não é? Então, os apoiantes de Costa achavam que Seguro era um fraco porque não aproveitou o “escândalo” que envolvia o Primeiro-Ministro – e agora, de repente, calaram-se todos! É só somar dois mais dois! É mais fácil acreditar na história da Carochinha do que na coincidência do timing da divulgação destas suspeitas – admitamos em nome da verdade. 

8. Qual foi o ponto mais delicado para Pedro Passos Coelho? É que, afinal, há mesmo um escândalo envolvendo o Primeiro-Ministro: Passos Coelho – imagine-se – não…prepara-se para esta revelação…não leu o “Principezinho” de Saint-Exupéry! Nós, que lemos várias vezes o “Principezinho” , pese embora não partilhemos a admiração geral pela obra,  estamos chocados! E será que António Costa leu o Principezinho? Apostamos que não: António Costa prefere os “10 Mandamentos para ficar calado durante meses” ou o “ A Arte do Silêncio para totós”. 

9. Enfim, é um escândalo: quem não leu o “Principezinho” (como uma revista acusou Passos Coelho) não merece ser Primeiro-Ministro. 

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