Os arquitectos mobilizaram-se para projectar as habitações possíveis que as populações mais carenciadas pretendiam, em especial nos bairros mais pobres das grandes cidades, mas também noutras localizações igualmente desfavorecidas. Os 'clientes' forneciam a mão-de-obra, os arquitectos desenhavam os projectos e o Estado pagava os materiais.
Independentemente da posição que cada um de nós tenha relativamente ao PREC e aos caminhos que começaram a trilhar-se nos primeiros tempos após o 25 de Abril de 1974, a experiência do SAAL – em que participaram nomes hoje sagrados da arquitectura nacional e internacional – foi o começo do sonho dos portugueses em ter habitação própria e essa memória merece ser visitada.
Para o efeito, bastará uma deslocação ao Museu de Serralves, no Porto, até 1 de Fevereiro do próximo ano. Lá pode ser vista a primeira grande exposição dedicada ao projecto arquitectónico e cívico do SAAL, um marco, em Portugal e no Estrangeiro, que talvez contivesse já, sem o consciencializar, uma noção de sustentabilidade hoje tão assumida na União Europeia.
Comissariada por Delfim Sardo, um professor e estudioso de arte que foi o director artístico da Trienal de Arquitectura de Lisboa de 2010, esta grande exposição de Serralves é, mais do que uma memória, uma oportunidade para repensar o sector num momento em que tentamos iniciar um percurso pelos desafios da reabilitação e ou regeneração urbanas, incluindo 'cidades' imobiliárias que nasceram há 40 anos.
Rever o SAAL como modelo histórico serve – lê-se na literatura que acompanha a exposição – «para questionar e debater os temas e desafios que nos põem a questão da habitação, bem como a sua relação de proximidade com a arquitectura». Num triângulo que contempla os profissionais do sector da construção e do imobiliário, a procura e o Estado. Tal como está a acontecer relativamente à reabilitação urbana que hoje nos mobiliza.
Relendo na memória que ficou deste processo, sublinho o 'serviço descentralizado e desburocratizado' que uniu o Estado, os profissionais do sector e os moradores, a quem hoje chamaremos procura ou população interessada. Neste contexto, produziu habitações, produziu reflexão séria e consciente sobre a cidade e os seus processos de planeamento e produziu arquitectura.
Por tudo isto e como profissional do sector que reflecte regularmente sobre os problemas do imobiliário, sugiro não apenas uma visita a Serralves para a exposição sobre o SAAL, mas também algumas das iniciativas artísticas paralelas à própria exposição. Como por exemplo a acção performativa Composição para 128 Fogos, que irá decorrer a 14 de Dezembro no Bairro da Bouça, projecto de Siza Vieira, e que terá a participação dos moradores a partir das suas próprias casas. Ou ainda um retrato audiovisual ficcionado de um complexo habitacional social, denominado Bloco, que irá passar no foyer do Auditório de Serralves a 24 de Janeiro e 1 de Fevereiro, último dia da exposição.
*Presidente da APEMIP, assina esta coluna semanalmente